Por paulo.gomes

Rio - Sempre se falou que os seres vivos são de alguma forma conectados — que se um for afetado, há prejuízos em cadeia para a vida no planeta. Estudo de cientistas brasileiros comprovou esta realidade, ao constatar que o desaparecimento de aves grandes, como tucanos, tem um efeito devastador sobre algumas árvores, como uma espécie de palmeira, o palmito-juçara (Euterpe edulis).

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Desaparecimento dos tucanos é prejudicial a algumas árvoresArte%3A O Dia Online

A análise foi feita em 22 áreas de Mata Atlântica. E provou a conexão entre os animais e as plantas. Os frutos do palmito-juçara são alimento para cerca de 50 espécies de aves, entre as quais os tucanos e também araçaris, papagaios, sabiás, arapongas e jacus. As aves, após as ‘refeições’, costumam levar sementes da árvore para longe, dando origem a novos pés de palmito em outros locais.

Sob coordenação do especialista em dispersão de sementes do Departamento de Ecologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Mauro Galetti, a pesquisa verificou que nas florestas onde há todos os tipos de aves, há palmeiras com frutos de todos os tamanhos.

Bicos pequenos

Em trechos em que as aves grandes desapareceram, porém, as árvores que brotam só dão frutos pequenos, que aves pequenas, como sabiás, consigam carregar. Essa alteração foi registrada em locais onde os tucanos foram extintos há mais de 50 anos pela caça ou devido ao desmatamento. “Os tucanos são importantíssimos para as plantas, porque além de dispersarem muitas sementes, estão entre as poucas aves que comem e transportam sementes grandes. Com sua extinção, muitas outras espécies de plantas podem sofrer os mesmos impactos detectados no palmito juçara”, disse Galetti à revista Fapesp.

O trabalho foi realizado por equipe da Unesp, da Universidade de São Paulo (USP) e da Federal de Goiás (UFG), além de pesquisadores da Espanha e do México.

Morcegos são reflorestadores naturais

Os morcegos também desempenham um papel importante na conservação da Mata Atlântica. Como O DIA mostrou mês passado, estudo realizado na Reserva Natural Salto Morato, no Paraná, comprova que os morcegos frugívoros (que comem frutos) são reflorestadores naturais. Em seus voos noturnos, semeiam áreas degradadas com espécies nativas.

“Avaliamos que os morcegos dispersam, por meio das suas fezes, as sementes dos frutos, tendo papel fundamental nas áreas que estão em processo de regeneração”, explicou o pesquisador Marcelo Guimarães Rubio, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que realiza o trabalho na reserva, mantida pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.

O estudo busca entender o comportamento dos morcegos, suas rotas de voo, a alimentação e o padrão de dispersão de sementes, para avaliar seu papel na recuperação da Mata Atlântica.

E os benefícios dos hábitos dos morcegos podem ser muito mais amplos. “Morcegos frugívoros ocorrem em todos os biomas brasileiros”, explica Rubio.

Semente não resiste ao calor

A redução no tamanho das sementes do palmito-juçara pode ameaçar o futuro da própria palmeira. De acordo com a pesquisa coordenada pelo biólogo Mauro Galetti, da Unifesp, as sementes pequenas têm dificuldade de se desenvolver em temporadas de clima mais seco.

“Como os modelos climáticos sugerem períodos de seca mais severa no futuro, em decorrência das mudanças do clima, uma proporção maior de sementes pequenas pode não germinar”, explica Galetti.

O pouco que resta da Mata Atlântica no Brasil encontra-se muito fragmentado, em áreas com menos de 50 hectares. Segundo o pesquisador, estas porções da floresta são muito pequenas para que se mantenham populações de grandes aves, que precisam de áreas extensas.

Segundo Galetti, são necessárias ações que resultem na interligação dos fragmentos de floresta e, ainda, uma fiscalização eficiente sobre a caça dessas espécies de aves e o contrabando ilegal do palmito.

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