Por felipe.martins

Rio - A ameaça de uma tragédia comparável à de Mariana, em Minas Gerais. É assim que moradores, produtores rurais, ambientalistas e dirigentes municipais já se referem ao projeto do governo do estado para a construção de uma grande barragem no Rio Guapiaçu, em Cachoeiras de Macacu, na Região Metropolitana. Temendo possíveis impactos sociais, econômicos e ambientais, entidades locais organizam um novo protesto contra o projeto no próximo sábado, na cidade.

“Há também que se considerar os riscos meteorológicos, pois a construção de uma grande barragem poderá trazer mudanças climáticas significativas para a região, devido ao aumento da evaporação e, consequentemente, o aumento das chuvas, podendo, a exemplo de Nova Friburgo e Mariana (MG), nos deixar expostos a catástrofes”, diz trecho de uma carta assinada pelos organizadores do ato.

R%24 110 milhões é o prejuízo%2C em reais%2C que a obra levaria à economia do pequeno município de 70 mil habitantesDivulgação

A polêmica já se arrasta há quase três décadas. A barragem, de acordo com o governo, vai ajudar no abastecimento de água de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí, área de influência do Comperj, na Região Metropolitana, e também à Ilha de Paquetá. “Cientes de que água é um bem de todos e essencial à vida, esclarecemos que não somos contra ceder água a esses municípios, oportunidade que sugerimos o estudo de alternativas de barragens menores e menos impactantes”, diz a carta que convoca a população.

O ato pretende reunir 5 mil pessoas no próximo sábado. A ideia é fechar as rodovias RJ-116 (Itaboraí-Cachoeiras de Macacu) no entroncamento com a RJ-122 (Rio-Friburgo), acesso à BR-116 na altura de Parada Modelo, na Rodovia Rio-Teresópolis. “Queremos mostrar que a barragem inundaria uma das maiores áreas produtivas de Cachoeiras, desempregando mais de 700 famílias e trazendo ameaça de vermos uma nova Mariana”, ressalta o presidente do Sindicato dos Produtores Rurais, Bruno Paciello.

No fim de 2015, o secretário estadual do Ambiente, André Correa, disse que a obra implicava no alagamento de 352 propriedades, onde moram cerca de 750 famílias, entre mil e 1,5 mil pessoas. “Não podemos tratar isso como um problema aritmético”, declarou à época, ao lembrar um compromisso assumido para não avançar com o projeto sem que a situação fundiária das famílias fosse definida.

A previsão era que os estudos ambientais sobre a obra terminassem em janeiro, incluindo o projeto executivo. Mas, segundo o ambientalista Sergio Ricardo, o processo de licenciamento está parado, aguardando as negociações. “Não se combate crise hídrica desmatando dez milhões de árvores da Mata Atlântica e promovendo o despejo e remoção de grande número de famílias de pequenos agricultores e de assentados da reforma agrária”, critica o fundador do Movimento Baía Viva.

Barragens menores poderiam ser uma alternativa

“A luta é contra os prejuízos que teremos. Nunca fomos ouvidos em todos esses 30 anos de ameaça de construção da barragem. O governo nunca nos procurou para conversar, e ignora um projeto que apresentamos como opção”, diz Mário Falcão, presidente do Sindicato da Agricultura Familiar de Cachoeiras de Macacu. Ele se refere a um projeto alternativo que sugere a construção de três barragens menores, evitando a remoção de tantos agricultores.

Estado tenta negociar com donos de terras que cultivam mandiocaDivulgação

O ambientalista Sergio Ricardo aponta um estudo da Uerj como a melhor solução para o problema da barragem. Segundo ele, órgãos ligados ao governo do estado, como os conselhos estaduais do Meio Ambiente e de Recurso Hídricos, concluíram que o estado deveria encampar a proposta da universidade.

“O projeto, que prevê a recuperação da bacia hidrográfica, do reflorestamento, de obras de recarga artificial da água subterrânea e outras obras sustentáveis de pequeno porte, é muito mais barato do que a construção da barragem”, afirma. Para ele, a obra esconde outro interesse. “O que eles (governo) querem é torrar mais de R$ 1 bilhão com essa obra.”

O convênio para a barragem foi assinado em dezembro de 2013 pelo então secretário estadual do Ambiente, Carlos Minc (PT), a presidente do Inea, Marilene Ramos, e o então diretor de abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, preso desde o final de 2014 pela Polícia Federal na Operação Lava Jato, que investiga esquema de corrupção na petroleira.

Reportagem de Marlos Bittencourt


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