A Colômbia anunciou que no país existem 3.177 grávidas com zika, mas nenhuma como histórico de microcefalia. Em São Paulo, dois casos de possível relação foram descartados também. Isso não é um forte indício de que o vírus não estaria ligado diretamente a casos de microcefalia em massa?
São dados importantes, sem dúvida, mas que precisam de mais pesquisas. Porque, em contrapartida, há, ao mesmo tempo, novos estudos que demonstram a caracterização completa do vírus em cérebros de fetos analisados com microcefalia. Então, no momento, a comunidade científica está diante de um enigma. Todas essas questões e evidências terão que ser juntadas para que se possa formar um mosaico definitivo mais adiante.
Os cientistas ainda estão tentando achar o fio da meada nas pesquisas. A imprensa não tem se precipitado em divulgar informações desencontradas, causando pânico?
À medida em que vamos tendo produção científica com solidez, ela tem que ser divulgada para a população, conforme recomendação científica mundial. Isso é importante, sobretudo, para desencadear ações de prevenção mais eficazes e conjuntas, fortalecendo o combate ao Aedes, o que já deveria ter sido feito há um bom tempo. Mas as notícias têm que ser com base em dados científicos concretos, para não alarmar. Todas as descobertas têm que ser compartilhadas imediatamente, primeiro com a comunidade médica, e em seguida com a população. Na época da ditadura, mantiveram a imprensa mal informada por um longo tempo sobre uma epidemia significativa de meningite, contribuindo para o não desencadeamento de ações preventivas, piorando ainda mais a situação.
A partir do dia 8 de dezembro, todos os casos notificados de microcefalia passaram a levar em conta o novo protocolo do Ministério da Saúde, que aponta que a suspeita de microcefalia será dada a bebês que nasçam com a circunferência craniana igual ou menor do que 32 centímetros. Antes, já havia a suspeita de microcefalia quando crianças nasciam com o crânio igual ou inferior a 33 centímetros. A notificação de casos suspeitos, que passou a ser obrigatória, contribui para o aumento das estatísticas? Isso talvez não apavore a população?
De um modo geral as questões ligadas ao conhecimento sobre o zika precisam ser mais aprofundadas. Então, prometer uma vacina num tempo muito curto é uma promessa dificilmente realizável. Todas as áreas que trabalham nesse setor mostram que se pode ter uma vacina que chegue a uma fase clínica rapidamente, mas um tempo razoável para se obter bons resultados é em torno de cinco anos. Seria excepcional ter resultado antes de cinco anos com pesquisas clínicas. No momento, é imprescindível o esforço de todos para acabar com reservatórios onde o mosquito Aedes aegypti possa se reproduzir. É fundamental que a vigilância ao vetor permaneça. Não podemos esquecer que ele é comprovadamente o vetor para os vírus dengue, chikungunya e zika.
Fale sobre a descoberta do vírus ativo na urina, na saliva e leite materno.
O zika é um Flavivírus, que pertence à família de virosos que infectam artrópodes (como insetos) e mamíferos. O que os pesquisadores da Fiocruz detectaram foi a presença de vírus ativo, com potencial de infecção na saliva e na urina. Essa evidência inédita sugere a necessidade de se investigar a relevância destas vias alternativas de transmissão viral. Ainda não sabemos se o vírus que está ali se replicando na saliva, consegue atravessar a barreira da mucosa, por exemplo. Se consegue atravessar a barreira do suco gástrico. Por quanto tempo ele sobrevive na urina e na saliva... Os flavivírus não têm históricos de se reproduzirem em vias aéreas. Então, há muita coisa para ser estudada. Não há implicação imediata de que isso significa. Mas o fato de se replicar na saliva, ou na urina, ou leite materno, significa que ele seja competente para ser uma via de disseminação para outras pessoas. No suor não existe nem evidências ainda da presença do vírus ativo nesse sentido.