Rio - Caco é uma expressão usada para definir improviso num texto de teatro. Na noite de sábado, ao usar o recurso para fazer crítica direta a dois protagonistas da crise política no país, um ator acabou em desgraça. Em uma das cenas de ‘Todos os Musicais de Chico Buarque em 90 Minutos’, Claudio Botelho sugeriu a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e referiu-se à presidente Dilma Rousseff como ‘ladra’. A plateia não gostou e começou a vaiar e gritar ‘Não vai ter golpe’. O musical, no Teatro Sesc Palladium, de Belo Horizonte, Minas Gerais, foi suspenso e Chico retirou a autorização para que Botelho use suas canções neste e em outros espetáculos.
Também produtor da peça e protagonista da história, Botelho chegou a expulsar a plateia: “Saiam do teatro”, gritava ele. A Polícia Militar enviou três viaturas para o local. Diante da tensão, o diretor da peça declarou a sessão encerrada e informou que os valores dos ingressos seriam devolvidos. O Sesc cancelou também a sessão de ontem à noite, que seria a última da temporada da peça na cidade.
Chico não se pronunciou a respeito, mas, de acordo com sua assessoria, reagiu “primeiro com espanto e depois com grande desagrado ao saber da postura do ator”. “Sempre faço improvisos em um determinado momento do espetáculo, incluindo comentários políticos, criticando de Dilma a Eduardo Cunha, e nunca enfrentei nenhuma reação negativa, ao menos, no Rio de Janeiro”, contou Botelho ao jornal O Estado de São Paulo.
O tumulto ocorreu quando o personagem de Botelho, o dono de uma companhia de teatro itinerante, chega a uma cidade onde não encontra ninguém na praça. Pelo texto original, ele diz: ‘Onde estão as pessoas dessa vila? Assistindo novela?’. Em seguida, vem o momento do improviso e, então, Botelho acrescentou: “Ou será que estão assistindo à prisão de um ex-presidente? Ou de uma presidente ladra que vem sendo vítima de impeachment?.”
Aí começaram as vaias no teatro, que reunia cerca de 200 pessoas e começaram os gritos de ‘Não vai ter golpe’ e ‘Chico’. Outra parcela do público começou a aplaudir. Diante da situação, diversas pessoas começaram a deixar o local, ao mesmo tempo em que o ator disse que não se importava e que retomaria o espetáculo após a saída dos descontentes.
RODA VIVA CONTRA DITADURA
Em cartaz desde 2014, o musical é composto por trechos e histórias das obra de Chico no cinema e no teatro, sobretudo da década de 1970, dentre eles, ‘Roda Viva’ (1967), que acabou se tornando um símbolo da resistência contra a ditadura. “O governo militar interrompeu uma apresentação de ‘Roda Viva’ em 1969. E agora vocês interromperam o nosso Roda Viva”, disse Botelho, antes de sair de cena. Na internet, fãs de Chico se mostraram indignados com o ator. A hashtag #vetachico# tomou conta das redes sociais. internautas entraram na página de Chico Buarque e do espetáculo para divulgar a hashtag #vetachico, pedindo que o compositor impeça o ator de seguir com a peça que leva seu nome.
Em nota, o Sesc e a Pólobh, produtora responsável pela peça, reiteraram que são “instituições apartidárias” e pediram desculpas pelos transtornos. “Compreendendo o momento pelo qual o país passa e primando pela segurança de todos, optamos pelo cancelamento da sessão prevista para este domingo”.
Em dezembro do ano passado, Chico Buarque foi alvo de uma discussão nas ruas do Rio. Cercado por um grupo de jovens na saída de um restaurante, ouviu: ‘Petista, vá morar em Paris. O PT é bandido’.
Ator também é acusado de racismo
Claudio Botelho ainda enfrentou ontem uma série de acusações racistas na internet após o vazamento de um áudio do camarim, em que ele discute com outros integrantes do elenco. Uma atriz discorda dele e diz que a plateia tem direito de vaiar uma provocação. “O artista no palco é um rei! Não pode ser peitado. Não pode ser interrompido por um negro, por um f.d.p. da plateia”, gritava.
A atriz Soraya Ravenle tenta acalmar o ator, argumentando que considerava um erro o acontecido, especialmente por causa da forte comoção que a política vem provocando no país nas últimas semanas.
Diversos sites, porém, divulgaram que o ator teria falado realmente a palavra ‘negro’. O ator se defende. “Eu falei ‘nego’, que é uma gíria muito usada no Rio quando se quer falar ‘cara’, ou seja, sobre alguém indeterminado”, disse ao ‘Estadão’.