Rio - O ex-governador Anthony Garotinho, um dos principais inimigos do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, esteve em Brasília conversando com a presidente Dilma com o vice, Michel Temer, com quem tem boas relações.
Em entrevista ao programa Jogo do Poder, da CNT, que contou com a participação do jornalista Caio Barbosa, do DIA, ele revela ter sugerido aos dois um ‘ato de grandeza’, que seria uma renúncia coletiva para tirar o país da crise e livrá-lo das mãos de Eduardo Cunha. “Não podemos ter um parlamento comandado por um ladrão”, disse o ex-governador. A entrevista vai ao ar neste domingo, às 23h15.
O DIA: Que avaliação o senhor faz do cenário político brasileiro?
Garotinho :Estamos num caminho perigoso. O melhor seria a presidente e o Michel Temer terem a humildade de dizer que não há governabilidade e convocassem eleições para que o povo pudesse votar. Ela se queixa de mandar as coisas para a Câmara e o Eduardo Cunha só votar as pautas-bomba. Ela tentou e não conseguiu. Ao contrario do que as pessoas pensam, a Dilma não está sendo julgada por corrupção. Mas por pedalada fiscal.
Um termo inventado por jornalistas, que não tinham como tipificar o que foi feito?
São dois pontos: ela tinha convênio com o Banco do Brasil e com Caixa Econômica. O BB pagava aos produtores o dinheiro do plano Safra e o governo pagava a diferença, a equalização. Com a Caixa era o Bolsa Família. Ela pagava e até o fim do ano o governo deveria devolver o dinheiro. Mas no fim de 2014 o governo não pagou e ficou um buraco. Houve roubo? Não. Houve uma dívida do governo federal com os seus bancos públicos. Isso é certo? Pela Lei de Responsabilidade Fiscal, não. Mas isso é motivo para cassar um presidente da República? O Lula fez isso. O FHC fez. Todos os governadores fazem. O Rio não faz pedalada, mas uma maratona fiscal. É muito pior. E nem paga salário!
E o segundo?
Ela editou oito decretos de suplementação sem autorização do Congresso. O que todo mundo sempre fez. O maior destes decretos foi feito pelo Temer quando Dilma estava viajando. Então, por que tirar ela e não ele? Sou a favor de tirar os dois. O que PT fez, com a cúpula antiga de José Dirceu, Delúbio, Vaccari, olha... mas trocar isso por Eduardo Cunha, Moreira Franco, Eliseu Padilha e essas figuras carimbadas como Jader Barbalho e Sarney?! Pelo amor de Deus!
Mas para saírem Dilma e Temer é preciso uma emenda constitucional ou a renúncia dos dois.
Renúncia dos dois. É mais digno. Foi o que falei com o Temer: "você e a Dilma têm de chegar na televisão e dizer à população que, pelo bem do país, vão colocar os mandatos à disposição para que o povo eleja alguém com legitimidade para arrumar esta confusão.
O Temer teria condições de reconstruir uma estabilidade política que permita ao Brasil voltar a uma certa normalidade?
Tenho boa relação com ele. E perguntei o que vão fazer com o Cunha. Não podemos ter um parlamento comandado por um ladrão. Eu demiti Cunha da Cehab (Companhia Estadual de Habitação) como ladrão. E esse homem hoje está aí...
Como o sr. vê a permanência dele no poder depois de tanta denúncia, das contas na Suíça...?
O que se descobriu dele até agora é fichinha. O Ministério Público sabe. A delação do Ricardo Pernambuco, da Carioca Engenharia, deu o número da conta, o nome do banco, e os valores depositados em Israel, na Suíça e nos EUA. São R$ 52 milhões só da Carioca Engenharia. E a Andrade Gutierrez? E as outras todas? Como um cidadão pode presidir o parlamento brasileiro sendo réu do STF por corrupção?!
O senhor falou com a Dilma depois da votação. Como foi o papo?
Estava muito abatida. Ela me disse: “Veja como são as coisas: vou ser condenada num julgamento comandado por um bandido”. Eu respondi: “a senhora sempre soube que ele era bandido. Ele não é bandido por estar julgando a senhora. É bandido há muito tempo. Vocês deixaram. Bandido é assim. Ameaça pular a janela. Ameaça arrombar a porta. Daqui a pouco ele entra na sua casa. Foi o que aconteceu”. Ela perguntou: "o que você acha que devo fazer? Tem gente que acha que devo sair, outros que devo ficar resistindo. Eu falei: “presidente, por que a senhora não toma a iniciativa e entrega o mandato para que o povo escolha?”.
E o que ela respondeu?
Não posso falar. Mas ela ligou para o Ricardo Berzoini (Secretário de Governo) e disse: “O Garotinho deu uma boa ideia. Falou para convocarmos uma cadeia de rádio e televisão, a imprensa internacional e eu falar que saio, mas para o Temer sair também e o povo escolher o novo presidente”.
Ela disse que faria isso se fossem eleições também para o Congresso.
Mas aí não passa (risos). Deputado não quer abrir mão de mandato. E ela estava muito chateada. Disse: “olha, Garotinho, tudo que eu e o Lula fizemos por aquele Sérgio Cabral e ele me manda o filho vir aqui votar contra. Isso é um vagabundo. Gente sem palavra”.
E a crise no estado? Que avaliação o senhor faz?
Avisei que isso iria acontecer. Quando começaram a dar incentivos fiscais para termas, casas de massagem, para o cabeleireiro da mulher do Cabral, eu sabia que o negócio iria quebrar.
Na campanha eles (do governo) exaltaram o sucesso financeiro do Rio e o creditavam ao bom relacionamento com o governo federal, que o senhor nunca teria conseguido quando governador.
Cascata. O governo federal emprestou o dinheiro. Chegou a hora de pagar. Nos últimos 6 anos, o Rio concedeu de incentivos fiscais e diferimentos R$ 138 bilhões. Isso dá para pagar a folha dos servidores por cinco anos. Uma coisa é dar incentivo, como eu dei para Peugeot-Citroën, para o Pólo Gás-Químico, que gera emprego e renda. Outra é dar para termas. É até imoral.
Nós não ficamos acomodados nos últimos anos com o valor do royalties do petróleo?
A crise não tem a ver com royalties. O Estado recebia R$ 8,5 bi e agora recebe R$ 5,5 bi São 3 bi. Num orçamento de R$ 76 bi não é nada. Campos perdeu R$ 1 bi no orçamento de R$ 2,5 bi e nem por isso atrasou salários. A crise no Rio tem três pilares imperdoáveis: a farra dos incentivos fiscais, o aumento da terceirização — alugaram até ar refrigerado de escola e viatura da polícia. E o aumento exponencial da corrupção.