Por daniela.lima
Rio - ‘Eu estava no meio do inferno”, recorda hoje a diretora do Circo Voador, Maria Juçá, sobre a fatídica noite, em 1996, em que o então prefeito eleito, Luiz Paulo Conde, cismou de comemorar a vitória na eleição sob a lona da Lapa, justamente quando havia shows de Ratos de Porão, Garotos Podres e Serial Killer. 
Rafael Vargens, Gaby Morenah e Lencinho, a nova geração do Circo VoadorDivulgação


Foi punk, literalmente: o político e seus assessores levaram uma tremenda vaia e o Circo acabou fechado pela prefeitura, alegando irregularidades. Um fechamento que durou oito anos, até 2004. Dez anos depois da reabertura, uma nova geração de produtores toca firme e forte os projetos por lá, e estreou ontem o ‘Picolé’, fazendo justiça à fama do local como palco de lançamento de novos nomes da cena musical. A primeira edição recebeu Letuce, Gabriel Muzak e Posada & O Clã. Para as próximas, dias 28 de janeiro e 11 de fevereiro, estão confirmados Mohandas, Larissa Luz, Negro Leo, Tono, Botika e Iara Rennó.
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“As manifestações populares do ano passado nos inspiraram. Os jovens precisam se juntar, debater, e nós aqui, através do Circo, temos a possibilidade de potencializar essa galera. É até uma responsabilidade histórica que o Circo tem com os novos nomes”, entusiasma-se Carlos Eduardo Smith, o popular DJ Lencinho (“Esse apelido é da época em que eu era headbanger e usava um lenço na cabeça”, entrega ele), 34 anos, que produz o projeto junto dos amigos Rafael Vargens, 30, e Gaby Morenah, 30 — esta, filha de Maria Juçá.
Além do ‘Picolé’, eles também estão tentando fazer com que em 2014 todo show tenha uma atração ainda não tão conhecida na abertura. “É um desafio, porque nem todo artista grande topa, alegando que isso mexe em seu som e seu palco”, ressalta Gaby. “A gente argumenta que eles já foram banda de abertura um dia. Além disso, estamos com uma equipe tão boa que a troca de palco do show de abertura da Alice Caymmi para o principal, da Mart’nália, por exemplo, durou apenas dez minutos.”
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Além da neta de Dorival Caymmi, grupos ainda não tão badalados, como O Terno, Macaco Bong e Baleia, já entraram no cardápio dessas apresentações, antecedendo artistas já consagrados.
Maria Juçá está tão entusiasmada quanto seus pupilos: “Eles eram praticamente umas crianças quando começaram a trabalhar aqui, há cerca de dez anos. E agora são os responsáveis por apresentar o espaço à sua geração. A primeira fase do Circo foi muito intensa e romântica, mas com muito improviso. Hoje, a espontaneidade não acabou, mas estamos bem mais profissionais”, compara.

MEMÓRIAS 
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Lencinho, Rafael e Gaby mal curtiram o Circo na tal primeira fase, antes da reabertura. Mas guardam com carinho e riqueza de detalhes lembranças de momentos históricos vividos nesses últimos dez anos.
“O Caetano Veloso estreou seu aclamado show ‘Cê’ aqui, em 2006, e o Chico Buarque escolheu o Circo Voador para fazer uma apresentação com a Mônica Salmaso, em 2007. O (grupo escocês de rock) Franz Ferdinand até hoje cita o histórico show que a banda fez na lona em 2006”, lista Rafael. “Mas, mesmo depois de emplacar esses nomes grandes, a gente não caiu na zona de conforto. Nunca esquecemos que o Circo tem isso de apresentar também o novo.” 
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Atualmente superbadalada, a Lapa, há dez anos, era outra. “Não se vinha tanto ao bairro naquela época. Lembro de convidar: ‘Vamos à Lapa?’ E responderem: ‘Mas será que vai estar cheio?’ A Fundição Progresso e o Semente estavam funcionando, mas o Teatro Odisseia tinha acabado de abrir. O Bar da Cachaça, que hoje vive lotado, só dava uma meia dúzia de elementos”, lembra Lencinho.
Maria Juçá espera que nunca mais tome o susto de ver o Circo fechar. “Lutei e luto muito por isso, até hoje. Mas essa geração que está aí é muito mais sagaz que a minha! A briga dessa vez seria muito maior”, brinca.
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