Por daniela.lima
Luis Pimentel%3A No escurinho do cinemaDivulgação

Rio - O que é isto?
— Um passaporte. Ele está dizendo para ela que vai embora, para sempre.
— Não disfarça.
— Verdade. Parece que ele não gosta mais dela.
— Não estou falando do filme, seu sonso. Estou perguntando o que é isto aqui, entre as minhas pernas.
— Minha mão, ora.
— Você não pediu permissão.
— E precisa?
— Saiba que não sou dessas.
— Já sei. Também não gosto dessas.
— Não está me agradando.
— Tudo bem. Podemos sair e procurar outro cinema. Tem um filme legal no Estação Botafogo.
— Não se faça de bobo.
— Eu te amo.
— Que ridículo!
— Eu?
— Não. O sujeito do filme. Olha que bigodinho mais cafona.
— Também acho.
— Eu vou gritar.
— Não faça isso, vamos evitar o escândalo.
— Então para.
— Não consigo.
— Por quê?
— Minha mão está presa entre as suas pernas.
— Tira a mão daí!
— Então abre as pernas.
— Nem morta. Se eu fizer isso, você se aproveita.
— Criou-­se o impasse.
— Como assim?
— No filme. Ele não sabe se pega o trem ou se vai jantar com ela.
— Precisa aparar essa unha.
— Farei isso hoje mesmo.
— Então vou abrir um pouquinho. Mas só um pouquinho.
— Você é uma boa menina.
— E você é um cafajeste.
— Fala baixo. Lá vem o lanterninha.
— Ele vai ver sua mão. Esconde.
— Onde?
— Aqui.

***
Essa crônica é do tempo em que havia escurinho no cinema. Lanterninha, para quem não está ligando o nome à pessoa, era o profissional que ficava nos corredores ao lado das poltronas, lanterna na mão, orientando aqueles que chegavam atrasados a encontrarem lugar na sala já escura.
Geralmente eram muito educados.
Hoje, o lanterninha não faria mais o menor sentido, pois as infernais luzinhas azuladas dos celulares (manuseados por mal-educados) fazem em parte esse serviço. Mal as luzes se pagam nas salas de projeção, elas entram em cena, comandadas por dedinhos nervosos que, atendendo ao apelo de mentes provavelmente atrofiadas, descobrem que é naquele momento que precisam trocar mensagens e tratar de todos os assuntos que ficaram pendentes durante o dia.
Desabafo feito, recomendo aos amigos que não desanimem com o cinema. Ainda é a melhor e uma das mais deliciosas diversões.

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