Rio - Fiz três entrevistas com o professor, pensador, historiador e escritor Joel Rufino dos Santos, o grande cidadão que o Brasil perdeu na semana passada. A primeira, no ano 2000, para a revista ‘Bundas’; as duas últimas em sua casa no Rio de Janeiro, no ano passado, para livro-perfil que estou acabando de escrever. Se fosse necessária ou obrigatória uma qualificação didática, para objeto de estudo ou mesmo livre compreensão, em que categoria profissional Joel deveria ser “encaixado”?
Como o escritor que premiou a literatura brasileira (especialmente a infantojuvenil) com obra de esmero e fôlego (contemplando também estudos históricos, biografias, de ciência política, romances e contos) que se aproxima dos 100 títulos e que lhe valeu, em 2004, 2006 e 2014, a indicação da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil para concorrer ao Prêmio Internacional Hans Christian Andersen — o Nobel do gênero? Ou como o historiador que construiu carreira acadêmica, currículo, respeito e prestígio com obra, pensamento e discussões que levaram questões como o racismo e os embates sociopolíticos a patamares dos mais elevados nas ruas ou nas universidades?
Como nome de ponta e equilíbrio no movimento negro (embora ele já tenha dito que a questão racial é e sempre será apenas “parte de um todo”)? Ou como o cidadão político que, por conta de sua reconhecida coerência encarou períodos de exílio e de prisão (experiência que lhe rendeu depois a organização de um livro comovente, quando tentou reescrever a sua história como pai, por meio das cartas coloridas enviadas do xadrez ao filho Nelson, então com 8 anos de idade — ‘Quando Eu Voltei Tive Uma Surpresa’, Editora Rocco, 2000)?
Vale lembrar que, além de todas essas atividades curriculares, Joel Rufino dos Santos ainda exerceu cargos relevantes na política ou em instituições, com passagens pela Superintendência de Cultura do Governo do Estado do Rio de Janeiro, Subsecretaria Estadual de Defesa e Promoção das Populações Negras, Subsecretaria de Justiça e Direitos Humanos e nos tribunais do Trabalho da 1ª Região e de Justiça do Rio de Janeiro, onde atualmente era diretor de Comunicação.
Dos seus primeiros textos publicados na revista ‘Recreio’, da Editora Abril (publicação encarregada de despertar o talento narrativo de inúmeros autores que são considerados fundamentais em nossa literatura para crianças e jovens) até os títulos mais recentes, a obra literária de Joel Rufino dos Santos se impõe com elementos que marcam a sua trajetória: a imaginação sem peias, o recontar com fantasia, poesia e verdade fatos históricos relevantes, além da fabulação e recriação de temas de origem popular — especialmente a negra e a ameríndia.
Suburbano e suburbanista, carioca e cidadão do mundo, Joel Rufino dos Santos foi, sobretudo, um grande sujeito.