Por karilayn.areias
Rio - Luciano dos Santos Souza, 39 anos, o Pregador Luo, é um rapper gospel. Mas não gosta do rótulo. “Nem chamo minha música de evangélica. O Leonardo da Vinci pintou os afrescos e ninguém chama aquilo de arte gospel”, exclama o artista, que após 14 discos independentes (solo ou com sua banda Apocalipse 16), estreia pelo braço cristão da Universal Music com o disco ‘Governe!'.
Pregador Luo%3A “Falaram que eu estava fazendo apologia à violência. É um meio (o gospel) preconceituoso pra cacete. E minha ideia era conscientizar”Divulgação

Dono de um histórico de parcerias com artistas seculares (Rappin’ Hood, Emicida, Chorão, Simoninha), Luo estendeu seu trabalho até para as artes marciais. Compôs temas para lutadores do UFC e chegou a gravá-los num disco, ‘Música de Guerra — 1ª Missão’ (2008).

“Eu sempre gostei de artes marciais, adorava aquela série ‘Kung Fu’, e minha mãe me botou no judô quando criança. Depois, comecei a acompanhar o MMA. Um dia, o Vitor Belfort me pediu para escrever um tema para ele entrar no octógono”, conta. “Vitor adorou e o empresário dele, Joinha, me disse: ‘Agora você vai ter que fazer música para fulano, beltrano, porque adoraram sua música’”, brinca Luo, autor também de temas para Minotouro e Anderson Silva, entre outros. E como o meio gospel reagiu a isso, Luo? “Ah, falaram que eu estava fazendo apologia à violência. É um meio preconceituoso pra cacete. E minha ideia era conscientizar as pessoas”.

Soltando versos de louvor em músicas como ‘Governe’, ‘Tem Que Ser Mais Ousado’, ‘Muita Bênção’ e ‘Derrubando Muralhas’ (na qual mistura rap e reggae), Luo tem reservas quanto ao que vê no meio evangélico. “Não gosto dessa coisa de ‘adoração’, que muitos usam como desculpa para influenciar as pessoas a só ouvirem coisas evangélicas. É uma forma de alienar. Tem pessoas idôneas, sensatas que estão no meio, mas o mercado se corrompeu”, assevera, contando que vê muita corrupção na igreja. “Um dia, a verdade vai aparecer e as pessoas vão ficar chocadas com o que certos pastores fazem. Acredito que nem façam por dinheiro. Fazem porque estão a serviço de outra fé. Não quero nem citar nomes para não correr riscos”.

Nascido na Zona Sul de São Paulo, Luo começou a escrever letras em 1988 e viu boa parte dos rappers nacionais se lançando. “Lembro do NDee Naldinho começando, Racionais...”, enumera. Em 1993, converteu-se e, em 1996, montou o Apocalipse 16 e passou a se lançar sozinho. “Dei um jeito. Quando recebi as primeiras cópias do meu primeiro disco, meti tudo em um saco de lixo e saí distribuindo. Fui aprendendo com o tempo”, lembra o rapper, que montaria o selo 7 Taças.

Disco após disco, Luo foi ganhando a atenção de artistas fora do meio gospel. “Tem essa briga boba entre secular e gospel, mas luto para quebrar isso. Nem lá fora vejo artistas com a minha atitude”, conta, lembrando com carinho a parceria que fez com Chorão e sua banda Charlie Brown Jr., na música ‘Nada É Impossível’, espécie de rap-new-metal que está justamente no disco ‘Música de Guerra — 1ª Missão’.
“Fiquei amigo do Chorão em 2000, 2001. Ele escutava meu som, me ligava para comentar as músicas”, recorda Luo, que tentou ajudar o amigo a largar as drogas. “Mas era difícil. O Chorão não era um garoto de periferia. Era um cara cheio de compromissos, com muita gente em volta. Quando gravamos, fizemos uma oração, e ele aceitou Jesus como Salvador”.
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O pastor doas racionais

Luo é um nome novo para muitos. Mas quem viu a apresentação dos Racionais MCs no Video Music Brasil da MTV em 1998, lembra dele sem saber: ele era o rapaz que interpretava um pastor protestante, logo na introdução do show. Muita gente se recorda disso até hoje, mas o Pregador garante ter sido melhor que sua carreira tenha demorado para engrenar. “Talvez eu tivesse passado rápido, sem atingir metade dos meus objetivos. Lembro que naquela noite eu era um completo desconhecido. Um dos tops da música negra pegou no meu crachá e disse: ‘Quem deixou você entrar aqui?’ Perdi muito do meu romantismo com o movimento negro depois disso”, relata. Na mesma noite, quem viu lembra, os Racionais (rindo bastante por trás das câmeras e de cara feia assim que foram para o palco) ficaram bastante irritados ao terem um discurso seu interrompido pelo apresentador Carlinhos Brown — a comitiva do grupo responderia insultando o apresentador ao vivo. “Ah, meu, o cara (Carlinhos) estava chato pra caramba lá, né? É o que a gente vê na TV até hoje”.