Por tamyres.matos
Rio - Uma suposta preferência por blocos temáticos no Carnaval carioca — como o Sargento Pimenta, com sua guitarras elétricas — tem deixado de pires na mão grupos que, para muitos, representam a essência e a história da folia no Rio. O Embaixadores da Folia, que desfila na Avenida Rio Branco em companhia dos tradicionalíssimos Cacique de Ramos e Bafo da Onça, não sabe se terá condições de ir para a rua neste ano. Seu fundador, Claudio Cruz, reclama que o poder público não tem dado a devida atenção aos blocos mais convencionais. E que blocos recém-criados contam com mais repasses do governo.
“No ano passado, recebemos quase R$ 12 mil, que com os descontos caiu para pouco mais de R$ 8 mil. Não resolvia, mas já ajudava. Este ano, o valor bruto caiu para R$ 4 mil, que não dá para nada”, reclamou Cláudio Cruz. O Embaixadores da Folia reúne bambas do naipe de João Roberto Kelly, Noca da Portela e Zé Luiz do Império.
O Embaixadores da Folia%2C que desfila na Avenida Rio Branco%2C no Centro%2C quer mais verba para blocos tradicionais%3A agremiação reúne bambas do naipe de João Roberto KellyFabio Gonçalves / Agência O Dia

A responsável pela ajuda de custo é a Secretaria Estadual de Cultura, que através de nota prometeu rever estes valores e aumentá-los. Mas apenas para o Carnaval de 2015. Neste ano, o Embaixadores e o Boêmios de Irajá, outro bloco que está na pindaíba, terão mesmo de se contentar com pouco.

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“A Secretaria de Estado de Cultura do Rio de Janeiro, por meio da Edital de Carnaval 2014, estabeleceu novas categorias e tetos de apoio financeiro, buscando contemplar diversos municípios do estado e também outras agremiações como os blocos de bate-bola, ranchos, afoxés, bois pintadinhos, entre outros”, explicou o órgão em nota.
Claudio Cruz contestou a explicação da Secretaria e lamentou que as atenções, segundo ele, estejam cada vez mais voltadas para blocos que não tem vínculo com a tradição do Carnaval carioca.

“Daqui a pouco eu vou criar o bloco ‘Toca Carnaval’. Adoro Beatles, mas o bloco do Sargento Pimenta tem que tocar na Inglaterra, não no Rio. O Exalta Rei tem que ir para o fim de ano num especial de TV, com o Roberto Carlos. O poder público tem que zelar pela tradição da nossa cidade”, pediu.

Mais marketing do que samba no pé

O professor de História e especialista em Carnaval Luiz Antônio Simas, que neste domingo estreia como colunista no DIA, é um crítico feroz do que chama de descaso aos blocos tradicionais.

“Acho que a gente corre o risco de ver uma ‘micaretização’ do nosso Carnaval. Pernambuco correu este risco, mas estancou o problema incentivando o frevo e a cultura local. Deveríamos fazer o mesmo por aqui”, disse Simas.

Blocos convencionais com seus instrumentos de sopro e suas marchinhas estariam recebendo menos verba da Secretaria Estadual de CulturaFabio Gonçalves / Agência O Dia

Folião assumido, o historiador lembra que os blocos temáticos têm arrecadado muito dinheiro ao longo do ano com oficinas de percussão e shows em casas noturnas da Lapa, o que não acontece com os blocos tradicionais da cidade.

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“Estes blocos temáticos não têm a menor relação com a cultura da nossa cidade e com a festa do Carnaval. Outro dia vi alguém dizendo que estão ultrapassando a barreira do samba. Ora, essas coisas nunca nem chegaram às fronteiras do samba”, contesta Simas.
A falta de grana não tem se resumido aos blocos de Carnaval. O Império Serrano, uma das escolas mais tradicionais do Rio, ainda não recebeu o prometido patrocínio da Prefeitura de Angra dos Reis, cidade que será o enredo da agremiação. A solução tem sido correr a sacolinha entre os foliões.
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Neste sábado, a escola fará a tradicional Feijoada Imperial, onde homenageará a Estação Primeira de Mangueira. A diretoria vai pedir a colaboração financeira dos imperianos ilustres para colocar a Verde e Branca na Avenida.