Por daniela.lima
João Pimentel%3A Sobre blocos e escolasDivulgação

Rio - Quando chega o Carnaval, recebo muitas ligações de colegas jornalistas para falar sobre blocos. As questões são sempre as mesmas: o gigantismo dos cordões e o impacto sobre a cidade, o xixi em prédios e canteiros, os motivos que levaram os cariocas a se apaixonarem por este Carnaval que já estava nas ruas desde os anos 80. Mas a questão do surgimento dos blocos temáticos lembra a velha discussão do desfile das escolas de samba. Os nostálgicos falam com saudosismo dos sambas clássicos, reclamam que as arquibancadas do Sambódromo, construídas há 30 anos, contribuíram para a verticalização dos desfiles, dos carros, e que o cronômetro faz com que tudo vire uma correria, inclusive o andamento da bateria. O contraponto está na turma que acredita que o Carnaval é um grande show mesmo, e que o maior espetáculo da Terra tem que ser superlativo e grandioso como um Carnaval do Paulo Barros; impecável e plasticamente perfeito como um desfile da Rosa Magalhães.

Não consigo ter uma opinião radical sobre esta discussão. Nos anos 80 já havia críticas ao Carnaval, aos sambas, à grandiosidade das escolas e ao fato de a Zona Sul ter invadido as agremiações, quando, a bem da verdade, a Portela, por exemplo, fez o movimento de conquistar novos torcedores e integrantes com ensaios no Mourisco. Movimento este copiado por algumas coirmãs. Particularmente, gosto muito da safra de sambas dos anos 80. Outro dia assisti a um vídeo com desfiles deste período e tomei um susto com as diferenças para o Carnaval de hoje. Tecnologia zero, mais samba no pé, muita cadência.

Não gosto desta história dos escritórios de samba, prefiro acreditar naquele compositor que sonha em ver a escola desfilar com sua música. Mas a realidade, infelizmente, é a mesma do futebol: não confie em todo mundo que beija a camisa da sua agremiação. Não sou pessimista nem nostálgico, ainda acredito em bons sambas, apesar de raros, em lindos desfiles e no amor de muitos sambistas pelas suas cores.

A questão dos blocos temáticos é bem mais recente, assim como a retomada das ruas. Vejo muita gente reclamando dos cordões que tocam Beatles, Raul Seixas, Wando, música sertaneja, rock’n roll. Não vejo problema e não acho nenhuma deturpação, apesar de não me comover com as inovações. Talvez por ser cria dos blocos mais antigos, que saem com sambas próprios, com identidade, com história pra contar. Talvez pelo fato de eu mesmo ser um compositor que vive o samba o ano inteiro, assim como meus pares. Mas não compartilho da ideia de que vai chegar um dia em que bloco temático será aquele que tocar samba.

O Carnaval é uma festa popular e libertária. E liberdade passa pelo respeito ao próximo, e às diferenças. Acho bacana que as pessoas exerçam a criatividade, o poder crítico, a possibilidade de reunir os amigos para festejar a vida, que não está fácil pra ninguém. Houve um tempo em que isso não era possível.

Acredito na atemporalidade da beleza e da emoção. A garotada de hoje, daqui a alguns anos, ainda vai lembrar destas novidades com nostalgia. Assim como me lembro dos desfiles dos anos 80. Meninos, eu vi. Dessa forma funciona o tempo e a implacável roda da vida.

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