Rio - Dinheiro e poder eram os principais temas do enredo pessoal do bicheiro Rogério de Andrade, patrono da Mocidade Independente de Padre Miguel, terceira escola a entrar na Marquês de Sapucaí no primeiro dia do Grupo Especial. Debutante na Avenida ano passado, ele dobrou a sua cota de quatro camarotes para oito este ano. Cada um custou R$ 75 mil, que, somados, saíram a R$ 600 mil. Para receber bem os 120 convidados, foram investidos mais R$ 400 mil, com decoração, bufê e um dos 50 DJs mais bem pagos do mundo. O português Antônio Pedro, conhecido como Pete Tha Zouk, de 35 anos, foi contratado para tocar na pista muita música eletrônica, uma das paixões do contraventor, frequentador de festas em Ibiza, balneário espanhol.
Na escola de Padre Miguel, especula-se que Rogério de Andrade tenha garantido mais de R$ 10 milhões para este Carnaval. O bicheiro, porém, não abre o jogo sobre os valores. “Tive ajuda de muitas empresas. O balanço não foi fechado”, afirmou.
Se os negócios na agremiação vão de vento em popa, na vida pessoal, ele também garante ser um empresário bem-sucedido.
“Tenho várias empresas em diferentes ramos. Tenho estaleiro, fazenda de café, imobiliária, tenho uma vida empresarial”, afirmou.
Ao pisar na pista do Setor 1 à frente da escola, mostrou logo quem manda no pedaço. “Quero a Claudia Leitte aqui agora”, ordenou.
A rainha de bateria foi chamada imediatamente. Ainda de roupão, ela reverenciou o público na arquibancada. E logo recebeu outra ordem: “Vai trocar de roupa”.
Ainda na concentração, ele anunciou que o carnavalesco Paulo Barros vai continuar na agremiação. “O contrato já foi renovado. Paulo Barros é 100% Mocidade”, garantiu o manda-chuva.
Rogério, sempre acompanhado do filho Gustavo, de 23 anos, não deu um passo na Sapucaí sem estar cercado por seguranças. No comando da escola, chegou a ter escolta de 12 homens. Para muitos era quase impossível chegar perto do bicheiro. Não foi o caso do presidente da Câmara de Vereadores, Jorge Felippe (PMDB), que deu abraço fraterno em Rogério na concentração. A empatia do bicheiro com o político não foi a mesma dele com o público. Embora o chefão da Mocidade acenasse com frequência para os espectadores, houve indiferença por parte da plateia.
A alegria do contraventor só ganhou contorno triste quando, após o desfile, ele lembrou do filho Diogo. O jovem morreu em outubro de 2010, aos 17 anos, em um atentado contra o pai. Eles estavam num Toyota Corolla blindado do bicheiro que explodiu na Barra da Tijuca.
“Nunca ia fazer uma homenagem dessas a ele. É uma dor grande que sinto. Cada vez que deito a cabeça numa cama, eu me lembro disso e choro”, afirmou, referindo-se a um carro alegórico que veio com as frases ‘Dinamitava o meu carro. Parava o tráfego e ria’, versos da música ‘O Último Dia’, de Paulinho Moska, inspiração do enredo da Verde e Branca.
Em 2009, Rogério foi condenado pela 4ª Vara Federal Criminal por formação de quadrilha, corrupção ativa e contrabando a 18 anos de prisão. Há recurso contra a sentença no Superior Tribunal de Justiça. A mesma corte concedeu um habeas corpus que garante a liberdade do bicheiro desde 2012.
Na Justiça Federal, ele ainda responde a dois processos: por lavagem de dinheiro e uso de moeda falsa. Ambos estão em segredo de Justiça. No 4º Tribunal do Júri, ele foi absolvido em processo no qual era acusado de ser o mandante da morte do primo Paulo de Andrade, o Paulinho, em 1998.
Rogério de Andrade: 'Procuro dar a volta por cima'
1 - Como foi a preparação da escola?
Fizemos um trabalho intenso, para resgatar a origem da escola. A união dos torcedores e da comunidade fez com que ela viesse com essa força na Avenida. Foi um desfile bonito.
2 - Paulo Barros e Claudia Leitte foram contratados a peso de ouro?
Não. A Claudia forma parceria com a Mocidade em relação a shows. Foi um acordo. O Paulo eu trouxe mais cativando-o para fazer um enredo autoral, mostrando o artista que ele é. Ele nunca tinha feito enredo autoral. Na Mocidade, vai fazer muitos.
3 - E o desfile?
Gostei de tudo. Mas o que mais me surpreendeu foi a empolgação dos componentes e torcida, e a disposição da Mocidade de correr atrás de novo título.
4 - Quanto custou o Carnaval?
A Mocidade estava lamentável há uma década. Vi a escola numa situação ruim e não podia deixar. Fiz com que a Mocidade voltasse a ser uma empresa. Tive ajuda de várias empresas. Quero o Carnaval cada vez mais profissional. Agora, sou só o administrativo, e não financeiro. Mas ainda não fechamos o balanço.
5 - É a volta por cima?
Tenho só um processo com recurso. Mas confio na Justiça. Tive uma perda que sofri muito. Procuro dar a volta por cima.
Patronos da Vila e Salgueiro são discretos
Ao contrário da ostentação e da exibição de poder de Rogério, os patronos das poderosas Vila Isabel e Salgueiro preferiram a discrição. Apontado como um dos grandes idealizadores da Liga Independente das Escola de Samba (Liesa), o bicheiro Ailton Guimarães Jorge, o Capitão Guimarães, nem desceu do camarote para acompanhar a passagem da Vila — como já fez em Carnavais passados.
Desde que foi preso e processado durante a Operação Furacão, em 2007, Capitão Guimarães evita chamar a atenção e posar para as fotos. Não significa falta força na escola. No ano passado, ajudou a tirar da presidência o ex-aliado Wilson Vieira Alves, o Moisés, e a eleger Elizabeth Aquino, a Beta.
O mesmo caminho segue o bicheiro Alcebíades Garcia. Herdou a paixão pela escola do pai Valdomiro Garcia, o Miro, e do irmão, Waldemir Paes Garcia, o Maninho, mas não o apetite por pousar como patrono do Salgueiro. É raro aparecer em público até nos ensaios na escola e, na Sapucaí, nunca foi visto à frente do desfile.