Por bianca.lobianco

Rio - João Roberto Kelly, 77 anos, viu o público cantar com ele todas as suas marchinhas no show que fez domingo, no Beco das Garrafas, em Copacabana. Não escondeu a felicidade ao ver que o repertório que compôs entre os anos 1950 e 60 ainda está na boca do povo — e ainda levou para o palco sua nova composição, ‘Ele Não Sabia de Nada’, que lança oficialmente no desfile do Cordão da Bola Preta, no sábado de carnaval.

João Roberto Kelly: O Rei das MarchinhasJoão Laet / Agência O Dia

A música foi feita há três anos (em parceria com Pedro Ernesto, presidente do Cordão da Bola Preta) e não é sobre político nenhum, afirma o compositor. “Ela é sobre um amigo que tinha uma namorada muito dadivosa ", brinca. "Como tem muito político sendo pego roubando e falando que não sabia de nada, ela ganhou esse sentido que as pessoas deram. Mas a carapuça cabe neles todos, claro".

SEM ‘MARIA SAPATÃO’

Recentemente alguns blocos do Rio reclamaram do conteúdo dito homofóbico de certas marchinhas. E as tiraram de seus repertórios — na mira, estavam temas de Kelly, como ‘Maria Sapatão’ e ‘Cabeleira do Zezé’, além de ‘O Teu Cabelo Não Nega’, de Lamartine Babo, tida como racista por causa do “mas como a cor não pega, mulata, mulata, eu quero o teu amor”. Perguntado sobre se o objetivo de uma marchinha de carnaval é provocar, ele explica que nunca teve o objetivo de ofender ninguém.

“Carnaval é uma grande brincadeira. Nunca foi minha intenção mexer com ninguém, de maneira ofensiva. Antigamente tinha músicas para os carecas, os barrigudos. ‘Cabeleira do Zezé’ nem era uma brincadeira com os gays. Era com aquela moda de deixar o cabelo crescer que vinha com os Beatles, por causa de um garçom que eu conhecia, o Zezé, que era cabeludo. Quem colocou aquele ‘bicha!’ na letra foi o público. Nem mesmo o ‘será que ele é?’ foi feito para brincar com isso”, conta Kelly.

Disso Kelly não sabia: um de seus versos mais conhecidos foi utilizado em 1997, quando o filme norte-americano ‘In & Out’, de Paul Rudnicku estreou no Brasil. Na película, que ganhou aqui o nome de ‘Será Que Ele É?’, o ator Cameron Drake (Matt Dillon) é premiado com um Oscar e, na cerimônia, agradece a um ex-professor da época de escola, Howard Brackett (Kevin Kline), dizendo que ele é gay.

“Sério? Não sabia mesmo!”, diz, rindo. “Mas claro que toda marchinha tem que ter uma maldade. Só não é para ofender. ‘Maria Sapatão’ fiz por encomenda do Chacrinha e vejo até como um elogio, porque a gente está falando que ‘o mundo aplaudiu’”.

‘NÃO É SOBRE POLÍTICA’

A nova marchinha de Kelly, , ‘Ele Não Sabia de Nada’ No fim de semana, Kelly divulgou que tinha feito uma marchinha em homenagem ao Bloco das Mulheres Rodadas, ligado ao movimento feminista ­­ - e que, dizia uma reportagem do jornal 'O Globo', tinha se posicionado (ao lado de blocos como Cordão do Boitatá e Charanga do França) a favor de que letras politicamente incorretas fossem banidas dos desfiles (a letra: "Eu quero uma mulher sabida/colorida, genial/pra me ensinar com muita linha/a fazer marchinha para o carnaval/eu quero ver o feminismo/sem modismo, sem paixão/que entenda como brincadeira/minha cabeleira e o meu sapatão"). Renata Rodrigues, uma das organizadoras do bloco, diz que nunca houve nenhum tipo de hostilidade contra Kelly e que adorariam fazia a melodia para a marchinha.

"Pretendemos inclusive encontrar com ele para agradecer. As pessoas cavam polêmica onde não tem. Não tocamos as marchinhas dele porque elas nunca estiveram no nosso repertório, já que tocamos músicas que falam de mulheres. O repertório de marchinhas é imenso e cada bloco escolhe de acordo com seus critérios", esclarece ela.

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