Alegoria da Unidos da Tijuca vai retratar o momento em que o pão virou moeda de troca em Roma, na época do 'Pão e Circo' - Daniel Castelo Branco
Alegoria da Unidos da Tijuca vai retratar o momento em que o pão virou moeda de troca em Roma, na época do 'Pão e Circo'Daniel Castelo Branco
Por *Luana Dandara

Após dois anos fora do Sábado das Campeãs, a Unidos da Tijuca aposta não só em contratações de peso para disputar o título do Carnaval, mas também em um desfile imponente que abordará temas como fé, desigualdade social e caridade. A escola entrará na Avenida com um abre-alas composto por três carros. O primeiro, guardado em segredo, recriará a famosa pintura da Santa Ceia, com esculturas de Jesus e seus apóstolos. Já os outros dois terão um gigantesco pavão, com 50 metros de comprimento e 13 de altura, equivalente a um prédio de quatro andares. A ave é símbolo da agremiação, e na religião cristã representa os olhos de Deus.

E enquanto a maioria das escolas sofre com atrasos na montagem do espetáculo em virtude da crise financeira, a Azul e Amarela já tem a maioria das suas cinco alegorias prontas, e outras em fase de acabamentos. A vantagem, entretanto, não é em virtude de patrocínio, mas sim da chegada do diretor de Carnaval Laíla, de 75 anos, que coordena os trabalhos após deixar a Beija-Flor no ano passado. O carnavalesco Fran Sérgio, 47, que atuou 23 anos na agremiação de Nilópolis, também é novidade na Comissão de Carnaval, composta ainda por Annik Salmon, 37, Hélcio Paim, 58, e Marcus Paulo, 44.

Segundo Marcus Paulo, a história do pão, enredo da Tijuca, é pano de fundo para falar de temais atuais. "Terão críticas ao momento que passamos no país, dos desempregados em busca do pão de cada dia, e da corrupção dos políticos", pontuou ele. O pão como alimento espiritual é outro destaque na escola. "O nosso samba é uma oração, e o nosso desfile também será assim. A Tijuca traz a mensagem de Deus com um clamor de amor ao próximo", acrescentou.

A última alegoria terá uma escultura de metade demônio e metade anjo. "Esse carro terá um grande forno, como se as pessoas tivessem sofrendo, assando no forno da desigualdade em virtude dos ardilosos. E do outro lado, estão aqueles dispostos a fazer caridade mesmo nessa situação", contou a carnavalesca Annik.

Na mesma ala, uma fantasia 'lobo em pele de cordeiro' lembrará as falsas promessas, assim como a 'vermes no poder', uma crítica aos políticos. O desfile será encerrado por 80 mulheres grávidas. "Elas representam a esperança, têm dentro do ventre crianças que podem mudar o mundo", explicou Annik.

O estreante na agremiação Fran Sérgio reforça que além de alegorias movimentadas, as alas serão teatralizadas. "Cada setor terá um ato, tudo bem teatral e ligado ao humano, não à tecnologia. Os carros surpreenderão no desfile", prometeu ele, que aposta na emoção como o trunfo da Tijuca. "A escola está muito grande, temos a plasticidade das alegorias. Mas o grande lance será a emoção na Sapucaí para envolver os integrantes e o público", finalizou o profissional.

"Se cada um fizer a sua parte, cada macaco no seu galho, todos terão o pão na mesa, sem desigualdade e preconceito", destacou Hélcio Paim.

Aliados na vida e afiados na dança, primeiro casal comemora sintonia

NEntre o casal de mestre-sala e porta-bandeira a sintonia é certa para a Sapucaí. Após dançarem juntos de 2009 a 2014, na Império Serrano e em São Paulo, Raphaela Caboclo, de 25 anos, e Alex Marcelino, 35, formam par novamente, defendendo a agremiação do Borel.

“Ela foi minha primeira porta-bandeira no Grupo Especial, a gente se entende no olhar”, afirmou Alex. “Conseguimos transformar o nervosismo em motivação”, complementou Raphaela.

Porém, além do Carnaval, o casal concilia profissões distintas. Alex divide o tempo de ensaios com
a função de enfermeiro em um hospital da Baixada Fluminense e na UPA de Comendador Soares. Já
Raphaela está no último ano da faculdade de Direito. 

"A gente concilia com a dança, pois a preparação é de alto nível. A Tijuca está brigando
pelo título do Carnaval”, disse o mestre-sala. 

Desfile terá família real e escravidão

No primeiro setor, a Unidos da Tijuca contará o surgimento do pão, na Mesopotâmia. Em seguida, o momento em que o alimento virou moeda de troca, em Roma, época do ‘pão e circo’. No terceiro, os fatos históricos relacionados ao pão ganham destaque.

"A Queda da Bastilha teve como estopim a alta taxação do pão. Maria Antonieta, inclusive, perdeu a cabeça por dizer à população ‘se não tem pão, que comam brioches’”, ressaltou o carnavalesco Marcus. Ainda nesse setor, a agremiação lembrará a chegada do alimento no Brasil, junto a família real. Um carro alegórico
representará um navio negreiro, com diversas esculturas negras de quatro metros de altura ao redor. "Eles comeram o pão que o diabo amassou”, disse ele.

Na penúltima parte do desfile, a fé entra evidência com Santo Antônio, Ogum e Nossa Senhora do Pão: o
alimento espiritual em várias religiões. No fim, a Azul e Amarela abordará a desigualdade. 

Estreantes

Segundo Fran, o obstáculo não foi entrar em uma nova agremiação, mas sim lidar com o baixo orçamento do Carnaval. “Ficou pior do que pensávamos, mas escolhemos materiais mais baratos, como a palha”. Para a comissão de Carnaval, contudo, a chegada de Laíla compensou as dificuldades do enredo ‘Cada macaco
no seu galho. Ó, meu pai, me dê o pão que eu não morro de fome!’. “Ele trouxe um bonde de sabedoria, tem um toque artístico muito apurado”, afirmou Marcus.

*Estagiária, sob supervisão de Angélica Fernandes

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