Rio - O resultado da votação para presidente levará o país a ter a eleição de segundo turno mais equilibrada de sua história. De um lado, Dilma Rousseff, com 41% dos votos. De outro, Aécio Neves, com 33%. Pela sexta vez consecutiva, o PT enfrentará o PSDB.
Dilma e Aécio, desta vez, têm entre si uma diferença de 8 pontos percentuais, com uma peculiaridade fundamental em relação às outras eleições: Marina Silva, que com 21% dos votos será o fiel da balança nesta disputa, considerada imprevisível por analistas políticos.
“A eleição vai ser decidida pelos eleitores de Marina. Parte considerável deles, em São Paulo está com Aécio. E é o maior colégio eleitoral do país. Por outro lado, é só São Paulo. Há uma boa parte do eleitorado de Marina de esquerda no restante do país e que não vota no Aécio de jeito nenhum. Vai ser uma disputa duríssima”, avalia a cientista política Maria do Socorro Braga (USP).
Nas duas primeiras vezes em que se enfrentaram, em 1994 e 1998, o PSDB venceu ainda no primeiro turno com Fernando Henrique Cardoso. Em 2002, o PT deu o troco e Lula venceu José Serra no segundo turno de forma confortável (61% a 38%), após um primeiro turno também relativamente tranquilo (46% a 23%).
Em 2006, a diferença entre Lula e Geraldo Alckmin foi apertada no primeiro turno (48% a 41%), mas num pleito com candidatos majoritariamente à esquerda, como Heloísa Helena (Psol) e Cristovam Buarque (PDT) a vitória na segunda etapa foi mais uma vez por larga vantagem (60% a 39%).
No último embate entre petistas e tucanos, em 2010, Dilma venceu no primeiro turno por 14 pontos de diferença (46% a 32%) e teve praticamente o mesmo desempenho no segundo, vencendo por 56% a 43%, uma diferença de 13 pontos. De acordo com a pesquisadora da USP, o surpreendente desempenho de Aécio no primeiro turno, com votação muito maior do que indicavam as pesquisas, se deveu a uma associação de sua campanha às virtudes do governo FHC na área econômica.
Especialmente quanto à estabilidade da moeda e na queda da inflação, muito embora os números do governo petista sejam ainda mais positivos. “Foi uma estratégia muito bem sucedida e não respondida a contento por Dilma, apesar dos números favoráveis. Ela terá, agora, o segundo turno para isso. E o Aécio para dizer de que forma fará estas mudanças que propõe, já que elas são muito mais próximas do programa do PT do que do PSDB”, diz Maria do Socorro Braga.
O segundo turno no Brasil foi instituído pela Constituição de 1988 e disputado pela primeira vez no ano seguinte, com a vitória de Fernando Collor sobre Lula por cinco pontos de diferença.
A onda Marina acabou como marola
A onda em torno de Marina Silva não era uma tsunami, como muitos imaginavam. Virou marola. Os motivos principais desta perda de força da candidata do PSB podem estar relacionados menos aos temas políticos e mais aos assuntos relacionados ao comportamento dos brasileiros, como aborto e união hmossexual
“Marina teve um desempenho ruim em temas comportamentais, muito próximos da sociedade, e isso causou uma insegurança muito grande no eleitor”, disse a cientista política Maria do Socorro Braga. Tida como representante da modernidade e do que fez questão de chamar de “nova política”, Marina não conseguiu se sobrepor nem mesmo a nomes como o do ultraconservador Silas Malafaia em propostas para a comunidade LGBT, por exemplo. No fim, terminou apelando a propostas até de 13º salário para os beneficiários do Bolsa-Família.
“Ela não conseguir ocupar um campo à esquerda e caiu para o centro. Sem posições claras, acabou parecendo muito ambígua, tal qual a velha política que dizia combater”, analisou Maria do Socorro. A candidata do PSB, que após a eleição deve tentar mais uma vez criar seu partido, a Rede Sustentabilidade, teve quase 3 milhões de votos a mais do que em 2010. Há quatro anos, Marina teve 19,6 milhões de votos. Desta vez, pouco mais de 22 milhões.
Marina ainda não decidiu
Em suas primeiras declarações após o resultado das eleições, Dilma Rousseff e Aécio Neves se consideraram vencedores do primeiro turno. “É a nossa sétima vitória. Ganhamos duas vezes com Lula em 2002, outras duas vezes em 2006, mais duas comigo em 2010 e agora esta. Quero agradecer ao povo brasileiro por mais esta vitória”, disse Dilma Rousseff.
Aécio Neves, por sua vez, se colocou como representante dos votos de oposição, que somados foram em maior número do que os dados à presidenta. “O sentimento de mudança foi vitorioso neste primeiro turno e fico honrado de ser o representante deste sentimento”, disse Aécio Neves.
O candidato do PSDB aproveitou para fazer um afago nos correligionários de Marina Silva ao homenagear Eduardo Campos, candidato morto em agosto num acidente aéreo. “Era uma amigo e um homem público honrado. Saberemos juntos transformar seus sonhos em realidade e agora é hora de unir forças”, disse .
Marina Silva deu pistas de que se manterá neutra no segundo turno. “É uma tendência”, respondeu, ao ser perguntada sobre se poderia não apoiar qualquer dos candidatos. A decisão final, porém, ainda não foi tomada. “Teremos um tempo, que deve levar em conta o sentido de urgência de uma eleição em segundo turno. Faremos nossas reuniões. Estaremos dialogando entre nós”.
‘Crianças na escola e sem fome’
A votação dos candidatos transcorreu em clima de tranquilidade. Dilma votou em Porto Alegre e exaltou os 12 anos de governo do PT. “Esse país mudou. E o nosso projeto é o único que pode continuar fazendo as mudanças”, disse Dilma. A presidenta destacou a primeira geração de crianças que foi à escola e que não passou fome. Aécio Neves votou em Belo Horizonte, e estava otimista em relação a sua presença no segundo turno. Preferiu, no entanto, a cautela no discurso, até por saber que precisarará do apoio de Marina.
“Tenho por ela enorme respeito e demonstrei durante toda a campanha. Disputa, assim como eu, a oportunidade de representar a mudança no país”, elogiou Aécio. No Acre, Marina votou sorridente e repetiu críticas ao governo petista, como fez durante a campanha. “Dilma está entregando o país pior do que encontrou. Nós vamos ganhar, coerentes com princípios e propostas. Estamos confiantes”, disse Marina.