Rio - Ele nunca precisou de batuta para reger, com maestria, os grandes esquadrões do futebol brasileiro nas décadas de 60 e 70. Mesmo assim, herdou o apelido, que ganhou status de sobrenome. Líder nato, habilidoso e goleador, o ponta de lança Silva ‘Batuta’ deixou saudade nos 13 clubes que defendeu em 20 anos de carreira.
Foi assim no São Paulo, no Corinthians, no Vasco, no Racing e no Flamengo, clube que marcou sua carreira e roubou seu coração. Hoje, aos 74 anos, Batuta continua a bater ponto na Gávea, precisamente no departamento social, onde faz a festa dos associados ao agendar as quadras e churrasqueiras do clube.
“Até hoje me pedem autógrafo e me tratam com muito carinho, mesmo eu tendo parado há muitos anos. Sou feliz, não tenho saudade e nem arrependimentos. O futebol me deu uma família maravilhosa”, diz Batuta, pai de três filhos, avô de quatro netos e orgulhoso por ter comemorado bodas de ouro com a mulher, Marta.
Por onde passou Batuta deixou a marca de salvador da pátria. Foi assim no Corinthians, em 1962, onde fez dupla com Ney e levou o Timão ao vice-campeonato paulista, um ano depois de a equipe ter sido saco de pancada no Estadual. Em 1965, no Flamengo, seu desafio foi ainda maior: após a saída litigiosa de Gérson, que foi para o Botafogo, o Rubro-Negro procurava um novo ídolo.
Batuta chegou e correspondeu. Foi artilheiro do time na temporada, com 20 gols, ao lado de Fefeu. Na companhia do inesquecível Almir Pernambuquinho, levou o time à conquista do Carioca e ao título do IV Centenário da cidade do Rio de Janeiro.
“Foi um grande momento e ainda joguei com o Almir, que virou um amigo. Apesar de explosivo, era um homem bom”, garante Batuta.
Decepção na Seleção
As grandes atuações com a camisa rubro-negra lhe valeram uma vaga no grupo que disputou a Copa do Mundo de 1966, na Inglaterra, e uma grande decepção. “Foi uma barca furada, mas valeu, pois defendi as cores da Seleção”, frisa, orgulhoso, referindo-se à derrota (3 a 1) que eliminou o Brasil, diante de Portugal.
Mas o fracasso no Mundial não atrapalhou a carreira de Batuta, que ainda jogou no Barcelona, no Santos e no Vasco, onde tirou o time de uma fila de 12 anos sem conquistas, no Carioca de 70. “Ajudei o Vasco a acabar com o jejum. Tenho boas lembranças do título”, observa Batuta, que encerrou a carreira aos 34 anos no Tiquire Flores, da Venezuela, em 75.
Clone de Tony Tornado e colecionador de pentes
Paulista da gema, como se define até hoje, Batuta não demorou a incorporar o estilo carioca. Nascido em Ribeirão Preto, mas morador de Copacabana, ele não dispensava o samba e o carnaval da Mangueira — foi comparado ao cantor Tony Tornado, que vivia o auge nos anos 70, foi um pulo.
“Muitos diziam que eu parecia com o Tornado. Ele virou um amigo. Às vezes, nos confundiam. Temos a mesma estatura, apesar de ele ser mais robusto. Achava divertido, ele era um cara do bem”, lembra, bem-humorado.
Na mesma época, Batuta começou a colecionar pentes para ajeitar o cabelo black power. Chegou a ter mais de 30. Hábito que não largou até hoje. “Olha o que tem no bolso da calça?”, disse, apontando para mais um modelo.
Carreira vitoriosa virou livro
Em 20 anos de carreira, Silva não conquistou apenas o coração da torcida do Flamengo. No Racing, da Argentina, onde jogou em 1969, tornou-se lenda. Era o ‘Feitiço Negro’, apelido que ganhou ao fazer 28 gols em 39 jogos do Campeonato Argentino e entrar para a história como o único brasileiro a se tornar artilheiro da competição.
Esta e outras histórias sobre ele são contadas no livro ‘Silva, o Batuta - o craque e o futebol de seu tempo’, do escritor Marcelo Schwob, que será lançado dia 15 de novembro, data do aniversário do Flamengo.“Ele é meu ídolo, sua história me impressionou tanto que escrevi um livro. Batuta merece todas as homenagens”, observa Schwob.