Por pedro.logato

Rio - Uma parte significativa da história do esporte aquático brasileiro por pouco não se perdeu por negligência de quem tinha a obrigação de zelar pela sua preservação. Há um ano e quatro meses, 45 troféus conquistados em Pan-Americanos, Sul-Americanos e torneios internacionais só não pararam no lixo porque foram resgatados, por acaso, do Parque Aquático Julio de Lamare.

“Fomos buscar doações de colchões e trampolins da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA), no Julio de Lamare, e havia um monte de troféus empilhados no chão, esperando a sorte, sem destino. Como não havia para onde ir, pedi ao motorista para trazê-los para a nossa secretaria, onde os guardamos com carinho. Quem sabe, no futuro, a CBDA tenha espaço para preservar a memória do esporte”, critica José Roberto Lopes Padilha, ex-jogador de futebol de Fluminense e Flamengo, atual secretário de Esportes e Lazer de Três Rios, cidade a 126km do Rio.

José Roberto posa com os troféus que foram desprezados no Julio de LamareMárcia Vieira / Agência O Dia

A denúncia de descaso à memória do esporte, apurada pelo Ataque, junta-se às graves acusações do Ministério Público Federal de São Paulo, que pediu há quatro dias o afastamento e o bloqueio dos bens do presidente da CBDA, Coaracy Nunes, e do diretor financeiro da entidade, Sérgio Ribeiro Lins de Alvarenga, por improbidade administrativa.

Sem local para abrigar os troféus, que registram a trajetória vitoriosa em Pan-Americanos e Sul-Americanos de atletas como Joanna Maranhão, Cesar Cielo, Eduardo Fischer, Gabriela Silva, Juliana Veloso e Maria da Penha Rodrigues da Cruz, entre tantos outros, as relíquias deixaram o Parque Aquático Julio de Lamare sem registro.

“Não pediram para assinar nada e nem detalharam o que estava sendo levado, quando os troféus foram carregados no caminhão. Parece que ficaram felizes por alguém cuidar, já que os troféus não tinham destino. Eles vão saber que estão aqui agora”, garante José Roberto, que também é jornalista e autor de seis livros sobre futebol.

HISTÓRIA PRESERVADA

Pós-graduado em História e apaixonado pela memória do esporte, José Roberto sonha em restaurar os troféus, que estão danificados, como o do XXVI Sul-Americano de Natação: “É meu sonho. Já encontramos uma pessoa aqui na cidade que se interessou em restaurá-los. Só precisamos de patrocínio para isso.”

Ao ser questionado se achava justo a Secretaria de Esportes e Lazer de Três Rios reformar troféus de uma entidade que recebeu de investimento no último ciclo olímpico mais de R$ 122 milhões, entre verbas de patrocínio e de leis de incentivo, José Roberto lamentou.

Danificado%2C o troféu do XXVI Sul-Americano de NataçãoMárcia Vieira / Agência O Dia

“Infelizmente, nem todos dão aos troféus o valor que um atleta dá. Aqui temos uma história no esporte e nosso olhar é um pouco diferente do presidente da confederação. A sucessão de mandatos cria um negligenciamento coletivo que leva a esses erros. Você fica cem anos no cargo e o troféu não significa mais nada do que entulho”, criticou, fazendo referência aos 28 anos em que Coaracy Nunes comanda a CBDA.

Nos Jogos do Rio, a entidade conquistou somente uma medalha, o bronze da nadadora Poliana Okimoto na maratona aquática. Nas piscinas, pela primeira vez desde Atenas-2004, a natação, que recebe grande parte dos investimentos, não subiu ao pódio.

CONFEDERAÇÃO DESMENTE ABANDONO E CULPA CHUVAS

Ao ser questionada sobre os troféus, a Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos se pronunciou em dois e-mails enviados pela sua assessoria de imprensa.

“Durante os 17 anos que a CBDA ficou nas dependências do Parque Aquático Julio de Lamare, ocorreram inúmeras inundações, que causaram enormes prejuízos na perda definitiva de equipamentos e documentos. Dentre estes estavam vários troféus, muito danificados e praticamente impossíveis de recuperação pelo material com que foram fabricados (...) Calculamos que o material encontrado por vocês esteja dentro deste contexto”, justifica, em e-mail.

A CBDA garante ainda dar muito valor à memória do esporte e pede de volta os troféus se estiverem em bom estado. Ao ser informado sobre as alegações da confederação, José Roberto replicou: “Quando os troféus foram recuperados, não havia chovido e o transporte foi feito à luz do dia. Meu sonho sempre foi entregá-los de volta.”

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