Por bernardo.argento

Rio - O início das oitavas de final da Copa do Mundo e do nono mês do calendário muçulmano coincidem neste sábado e geram um sério dilema aos jogadores das seleções que conseguiram passar da fase de grupos. O mês sagrado do Ramadã, que neste ano irá até 28 de julho, 15 dias depois da final da Copa, impõe um restrito jejum a todos os muçulmanos, que, para se purificarem, devem se abster de comer, beber, fumar e manter relações sexuais. No entanto, essa restrição costuma ser respeitada apenas durante o dia, já que os muçulmanos costumam se alimentar antes do amanhecer e após o entardecer durante o Ramadã.

As partidas da Copa, por outro lado, serão disputadas entre as 13h e 17h de Brasília, ou seja, em um ambiente de temperatura e umidade elevadas. O dilema sobre jejuar ou não afetará principalmente a seleção da Argélia, que se classificou em segundo lugar no grupo H e deve preparar um plano B para evitar um adversário extra nas oitavas: a desidratação. De acordo com a filosofia islâmica, seus fiéis também devem rezar cinco vezes por dia durante o mês do Ramadã, outro fator que pode prejudicar a preparação e o rendimento dos jogadores muçulmanos no Mundial.

No entanto, este panorama não parece preocupar o técnico da França, Didier Deschamps, que preferiu ressaltar seu profundo respeito pela diversidade religiosa e deixar a palavra final a seus jogadores."Não estou muito preocupado porque esse não é um problema de agora, e cada um deverá se adaptar à situação", declarou Deschamps após assegurar a classificação de sua seleção, que conta com dois muçulmanos: o atacante Karim Benzema, de origem argelina, e o meia Moussa Sissoko, de origem malinesa.

Slimani, da Argélia, faz reverência religiosa na comemoração do seu golReuters

Se a seleção francesa corre risco de perder dois de seus principais jogadores, a Nigéria, sua adversária nas oitavas de final, conta com um elevado número de muçulmanos. A data do mês sagrado varia a cada ano, já que o calendário islâmico segue o calendário lunar. Apesar de ganhar evidência agora, esse problema relacionado ao jejum de jogadores não chega a ser uma novidade. Quando treinava o Inter de Milão, no final de 2009, o treinador português José Mourinho se sentia frustrado com o desempenho do meia ganês Sulley Muntari e não hesitou em atribuir esse fato ao jejum do jogador. No entanto, suas declarações geraram uma grande revolta no mundo islâmico.

"Nunca comprei e jamais comprarei jogadores que tenham este tipo de problema", declarou na ocasião o presidente do Lazio, Claudio Lotito, que afirmou que "um mês inteiro sem poder comer e beber durante mais de 10 horas diárias não combina muito bem com as partidas do domingo". Para o chefe da equipe médica da Fifa, Jiri Dvorak, os jogadores não devem ter a condição física prejudicada. "Realizamos exaustivos estudos com os jogadores durante o Ramadã, e a conclusão foi que, se for respeitado de maneira apropriada, o jejum não resultará uma redução nos rendimentos físicos dos jogadores", declarou Dvorak.

No entanto, essa opinião não é compartilhada pelo meia alemão Mesut Özil, de origem turca. Segundo ele, o consumo de água e alimentos é necessário para manter sua condição física de um modo geral e não só nos dias de jogos. "O Ramadã começa no sábado, mas eu não poderei cumprí-lo porque tenho que trabalhar", afirmou o jogador em uma entrevista nesta semana. Neste caso, o Islã também abre exceções para o jejum, como o caso das mulheres grávidas, das crianças e adultos com problemas mentais, entre outras exceções. Quem precisa fazer viagens longas ou a trabalho também costuma ser liberado.

Para os muçulmanos, o Ramadã não é simplesmente a realização do jejum, mas sim um período para estender sua devoção através de atos de caridade e doação. Isto pode explicar a atitude do ganês Muntari, que foi visto nas ruas de Maceió dando autógrafos e dando dinheiro aos moradores da região

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