Rio - O baixinho invocado, que ganhou fama nos anos 80 pelos dribles desconcertantes que aplicava nos tempos da Máquina Tricolor, deu uma guinada de 180 graus. Há dois anos, o ex-ponta-esquerda Gilson Gênio concilia a vida de treinador com a de pastor da Igreja Assembleia de Deus, em Jesuítas, na distante região de Santa Cruz. Pastor atuante, o ex-jogador prega o evangelho com fervor e dá testemunho diário da palavra de Deus.
“Era católico roxo, fiz primeira comunhão, fui coroinha, ia à missa, mas me sentia vazio. Um dia, tive vontade de entrar em uma igreja evangélica e chorei. Achei que não era merecedor de tudo que Deus havia me dado. Há oito anos aceitei Jesus na minha vida e tudo mudou”, revela.
Mas a transição para a vida religiosa não foi fácil. “Era técnico do Fluminense aqui fora, mas na igreja era diácono, fazia de tudo, até faxina. Depois fiquei mais de um ano ano desempregado. Nesse período, Deus transformou minha vida. Ele me levou para a Série C e hoje estou recomeçando”, acredita o treinador, que há um mês deixou o comando do São Pedro, da Região dos Lagos.
O desemprego, porém, não lhe tirou a fé:“Estou na Série C, mas Deus não tirou José do cárcere para elevar a governador do Egito? Então, Deus pode me tirar da Terceira Divisão e me colocar novamente em um clube grande. Se não for de treinador pode ser para observar jogadores.”
Experiência não lhe falta para desempenhar qualquer função no futebol. Se a carreira de treinador ainda não decolou, na base Gilson fez bons trabalhos no Fluminense e Botafogo. Como jogador, nem se fala. “No Flu fui bicampeão carioca em 75 e 76 com a Máquina. “Sempre digo que era o 12º jogador daquele time incrível”.
Gilson também brilhou no Bangu, onde foi vice-campeão brasileiro, em 85, e no América, onde sagrou-se Campeão dos Campeões, em 82. “Fiz o gol do último título do América, na final contra o Guarani (2 a 1). Ganhei uma TV colorida. Fiquei marcado”, lembra Gilson, que é sempre questionado sobre a origem do sobrenome que virou sua marca registrada.
“Foi por causa de um jogo com o Vasco em que dei vários dribles desconcertantes. Os torcedores da Ilha-Flu acharam as jogadas geniais e colocaram a faixa “Gilson Gênio no jogo seguinte. Como achei um exagero dizia que era Gênio, porque cabia na lâmpada”, diverte-se.
Sem jantar na casa do ídolo Rivellino
Nos tempos em que era o 12º jogador da Máquina Tricolor, Gilson Gênio tinha Rivellino como maior ídolo. E admite que tentava imitá-lo. “Eu era o Rivellino dos juniores, baixinho, dava o drible passando a perna por cima da bola, meio invocado. Via ele jogar e tentava fazer igual”, confessa.
Com o tempo a admiração virou amizade, apesar de Gênio recusar os convites para jantar na casa do craque.“Vinha o prato todo arrumado com aquele bolinho pequeno de comida e eu envergonhado, não repetia. Saia correndo para pegar o jantar da concentração. Naquela época, comia muito”.
Goleada de 5 a 0 no Santa Cruz entrou para a história
Apesar dos títulos por Fluminense, América, Grêmio e Inter de Limeira, foi com a camisa do Bahia que Gilson Gênio viveu seu dia de glória. A inesquecível goleada por 5 a 0 no Santa Cruz ainda é lembrada. Como havia perdido o primeiro jogo por 4 a 0, o time baiano precisava vencer por diferença de cinco gols para avançar no Campeonato Brasileiro de 81.
“Ganhamos de 5 a 0 e eu fiz dois gols. Foi uma das maiores emoções da minha carreira. Quando começou o jogo não tinha ninguém, estava todo mundo na praia. Quando acabou, a Fonte Nova foi invadida, parecia título. Foi um jogo histórico”.
Sobre o dia mais triste da carreira, Gilson não hesita: “Joguei 32 dos 34 jogos em que a Inter de Limeira foi campeã paulista, em 86. Fui sacado para o Lê, que era da cidade, entrar. Teve um papo que a entrada dele foi patrocinada. Deixa para lá”.