Por nara.boechat

Rio - Mais um capítulo da biografia de Charlotte Cohen foi escrito na última semana. A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Tráfico de Pessoas pediu urgência à Defensoria Pública na investigação do caso da cineasta, suspeita de ter sido vendida para uma família na França quando tinha apenas 2 meses de vida. O pedido do secretário-executivo da CPI Manoel Alvim foi feito um dia após o depoimento de Charlotte à comissão sobre o seu processo de adoção há 26 anos na última terça-feira. 

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Após a audiência, oito pessoas foram chamadas para falar na CPI, entre eles Guiomar Morselli, suspeita de ter feito a venda da jovem, e Maria das Dores, mulher identificada como mãe de Charlotte na primeira certidão da cineasta. “Todos os indicativos a partir do depoimento dessa moça é que ela foi vítima, provavelmente com outras tantas crianças, de tráfico internacional. Foi sequestrada quando bebê por uma articulação legal de adoção, levada para França por uma agenciadora dona de um orfanato”, disse o deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA), presidente da CPI.

Charlotte Cohen presta depoimento na CPI do tráfico de pessoasJoão Laet / Agência O Dia

Charlotte Cohen deixou o Brasil em 1987 junto com outra criança identificada como Rafael, que constava como seu irmão em uma certidão de nascimento. Adotada por uma família nobre em Paris, na França, Charlotte cresceu sabendo que era brasileira, mas soube do crime apenas aos 14 anos, quando descobriu no escritório do pai uma pasta com todos os documentos que indicavam a venda da menina.

Desde então, a professora e cineasta busca informações sobre a sua adoção e o paradeiro da sua mãe biológica. No entanto, a caça pela verdadeira identidade foi intensificada anos depois. Após se formar em Letras e Cinema na Universidade de Sorbonne, a jovem veio para o Brasil e desde 2012 mora no Rio de Janeiro.

Uma das suspeitas mais fortes que Charlotte segue após colher depoimentos de conhecidos e ex-funcionários do orfanato é a de que seria filha de um dos filhos de Guiomar, Ricardo, com uma empregada ou até mesmo filha de Franco, marido da dona do orfanato, com uma outra mulher. Com a abertura das investigações, foi pedido o exame de DNA à família Morselli. "Se eu sou filha de um dos dois (Franco ou Ricardo), eles fizeram isso por questão econômica. Então, quero mostrar para eles que o que não estavam querendo agora vai acontecer".

Inquérito de 1992

No mês passado, Charlotte descobriu na PF um inquérito de um caso semelhante ao seu também envolvendo Guiomar Morselli, antiga responsável pelo orfanato Lar do Menino Jesus, em São Paulo. O processo foi instaurado após denúncia do Consulado da França, quando duas crianças brasileiras foram registradas no país. O processo de fevereiro de 1992 teve três indiciadas: Guiomar, Marisa Bueno Cabral - dona da casa indicada como o local onde Charlotte nasceu - e Maria José Pedroso.

Charlotte foi levada para a Europa ainda bebêJoão Laet / Agência O Dia

Segundo a cineasta, que teve acesso ao documento, Maria José é apontada como mãe de dois bebês, Charles e Julian, que foram levados recém-nascidos para a França. Guiomar e Marisa aparecem na certidão dos meninos como testemunhas, assim como ocorreu na adoção de Charlotte cinco anos antes.

Maria José Pedroso foi chamada pela PF em 1995 e em depoimento afirmou que conheceu Guiomar através de sua sobrinha Roseli de Oliveira, quando estava grávida do terceiro filho e não poderia ficar com o bebê. Roseli, segundo o depoimento, trabalhou no orfanato e que Guiomar acolhia mães solteiras e depois doava os filhos à terceiros. Dias após a doação, Maria José foi chamada por Guiomar para registrar o filho e outro bebê em um cartório e levá-los para os pais adotivos na França.

O inquérito de 1992 durou até janeiro 1999, quando foi arquivado. O relatório mostra que Julian foi adotado por uma família com o sobrenome Cohen Tanugi, o mesmo de Charlotte. "Não resta dúvida alguma que Maria José Pedroso cedeu seu nome e eventualmente seu filho para a prática delituosa recriminada, a qual foi urdida por Guiomar Morselli, com a anuência e colaboração de Marisa Bueno Cabral, cujo endereço serviu como sendo o do parto", diz o documento final.

Parte do relatório final do inquérito de 1992 envolvendo os mesmos suspeitos do caso Charlotte CohenReprodução

Com a possibilidade de ser mais uma prova para o seu caso, Charlotte conseguiu desarquivar o processo e espera que o inquérito sirva de prova para o seu caso. "Antes eu tinha certeza que o Ricardo era meu pai, mas agora, vendo o tamanho desta rede, eu já não sei", afirma a cineasta. "Eu vi o que ela fez com outras crianças".

Com informações da Agência Brasil

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