Por bferreira

Rio - Uma história que poucos sabiam veio à tona: a jornalista Miriam Leitão foi presa em 1972, quando estava grávida de um mês do primeiro filho, torturada nua, trancada numa cela com uma cobra e apanhou de militares numa das muitas atrocidades que aconteciam no Brasil nos tempos da ditadura. O martírio de Miriam, divulgado no site do Observatório da Imprensa, ficou por muito tempo restrita à família e a poucos amigos. “Nunca achei que merecesse muito destaque. Acontece que tive muita sorte. Saí viva. Minha história teve final feliz”, desabafa a jornalista.

Foto de Miriam Leitão fichada estavam no Superior Tribunal MilitarReprodução

Na verdade, a história surgiu depois que seu filho mais novo, Mateus Leitão, resolveu remexer no passado. Foram mais de três meses de pesquisa em vários arquivos do país até chegar ao arquivo do Superior Tribunal Militar, em Brasília. “Depois de muita pesquisa, consegui encontrar a ficha da minha mãe num porão do STM”, diz Mateus.

Mateus conta que os militares exigiram que ele apresentasse um documento com autorização dos pais, afirmando que ele era seu filho, para que, só assim, conseguisse uma cópia da ficha com a foto da mãe na época em que ela foi presa, em dezembro de 1972.

“Essa pesquisa era algo com que eu sempre sonhei. Eram raras as vezes em que essa história surgia na minha casa, mas, quando surgia, eu prestava muita atenção. Eu sou o único da família que não sofreu as mazelas da tortura e, talvez por isso, tive condições emocionais de buscá-la”, confessa Mateus, que foi registrado com o codinome que o pai usava na clandestinidade.

Miriam conta que começou a revisitar essa história há três anos, desde que a Comissão da Verdade foi criada, em 2011. “Há três anos, quis voltar à fortaleza, em Vitória, onde fui presa e torturada. Foi difícil. Não contei para ninguém. Fui lá sozinha, como se fosse possível refazer aquela viagem”, revela a jornaslista.

Miriam diz também que não pode afirmar se o ‘Doutor Pablo’, que a torturou e que colocou uma jibóia na cela em que ela estava presa, era o coronel Paulo Malhães, encontrado morto em abril deste ano e que pouco antes havia confessado à Comissão da Verdade ter participado de torturas a presos políticos na ditadura.

“Eu sabia se tratar de um capitão de guerra, pois ouvia conversas do grupo que me torturava. Mas isso para mim não é o mais importtante. O mais importante é que as Forças Armadas assumam que erraram. Eles instalaram uma ditadura e mataram muitos brasileiros. Não assumir isso é consolidar uma mentira”, desabafa a jornalista.

Jornalista cobra posição do governo

Há quase dois meses, Miriam Leitão entrevistou para a GloboNews o ministro da Defesa, Celso Amorim, que comanda o Exército que a prendeu e a torturou há 42 anos. Durante a entrevista, ela confrontou o ministro e cobrou uma posição do governo sobre a ação das Forças Armadas em tortura e assassinatos de presos políticos.

Miriam foi a Brasília para ouvir o que o chefe civil dos militares tinha a dizer a respeito de uma sindicância considerada insignificante, realizada pelos três comandantes das Forças Armadas, e que havia sido entregue dias antes à Comissão da Verdade. No documento, de 455 páginas, nenhum sinal de desvio de finalidade” nos sete centros militares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica que serviram de cenário para os graves casos de violações aos direitos humanos praticados pelo regime militar de 1964-1985.

A jornalista se transformou num gigante ao confrontar o ministro. Acuado, Celso Amorim não esclareceu muita coisa. O que se viu foi um diplomata em saia-justa.

Reportagem de Marcio Allemand

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