Por bferreira

Rio - Um dos sambas mais famosos da Imperatriz Leopoldinense diz o seguinte: “Vem cá, Brasil. Deixa eu ler a sua mão, menino. Que grande destino reservaram para você”. É inspirado em “Martim Cererê”, poema nacionalista de Cassiano Ricardo, publicado em 1928, mesmo ano de “Macunaíma”, de Mario de Andrade. Não sei bem o motivo, mas sempre que a vida do país fica meio nebulosa, a letra ufanista me vem à cabeça.

É o que está acontecendo nestes dias de escândalo da Petrobras, crescimento em baixa, inflação em alta e sociedade dividida. Apesar de tudo, não é hora de entregar os pontos. O Brasil vai seguir em frente. É maior do que a crise ou maior do que o buraco, como dizem os céticos. Por que não dar crédito à previsão do ex-presidente Lula? Segundo ele, os críticos de Dilma Rousseff vão ter uma surpresa extraordinária. “Ela sabe que tem que fazer o melhor governo deste país. Tenho certeza que ela vai dar um show”, afirma Lula.

Diante do que se vê por aí, pode ser excesso de otimismo de Lula. Afinal, os analistas preveem que Dilma não terá boa vida no início do segundo mandato. Além da oposição com a faca nos dentes, a base aliada não parece tão dócil quanto no passado. Tome-se como exemplo a polêmica candidatura do deputado Eduardo Cunha à presidência da Câmara. Também são esperadas enormes dificuldades na economia.

Fala-se da necessidade de realizar um forte ajuste fiscal, com corte de despesas. No exterior, as agências de classificação de risco não param de fazer críticas e ameaçam com o rebaixamento do rating do Brasil, que poderia perder o grau de investimento. O ambiente é, portanto, inóspito, se comparado ao do fim do governo Lula em 2010.

Por melhores que sejam seus dotes executivos, Dilma Rousseff tem tarefa dificílima pela frente. Porém, pelos movimentos iniciais na formação do futuro ministério, tudo indica que assimilou lições do primeiro mandato. Não parece disposta a permitir o loteamento da máquina pública que fez mal não apenas à Petrobras, mas também a áreas importantes da administração. Pode ser necessário entregar postos-chaves a partidos aliados em nome da sustentação política, mas há que exigir a indicação de nomes qualificados. O loteamento não deve pôr em risco o bom funcionamento do governo. O novo critério, com base no mérito, também se aplica ao próprio partido da presidente, o PT.

Se a escolha da equipe econômica serve de aperitivo, deve-se reconhecer que Dilma atirou na direção certa. Perdeu um pouco de tempo com o convite ao presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco (por pressão de Lula), mas vai entregar a política econômica a um triunvirato que, antes mesmo de oficializado, foi bem recebido pelo mercado financeiro. Alexandre Tombini permanecerá à frente do Banco Central, o Planejamento ficará com Nelson Barbosa, ex-secretário executivo da Fazenda, e Joaquim Levy, ex-secretário do Tesouro Nacional, assumirá a Fazenda. Da escola ortodoxa e emérito enxugador de custos, Levy, atual diretor do Bradesco Asset Management, provocou choro e ranger de dentes no PT. A presidente adiou a mudança, mas não deve voltar atrás.

Dilma Rousseff vai ser mais exigente com os aliados. Dentro de quatro anos, sairá do Palácio do Planalto para entrar para a história como a primeira mulher a ter governado o Brasil republicano. Está preocupada com sua biografia.

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