Por karilayn.areias

Rio - Em uma das músicas que fez sobre o Rio de Janeiro, o compositor Moacyr Luz escreveu: “doce e calorosa, a minha história escorre aqui”. Os versos servem de metáfora para entender a importância da cidade para a trajetória política do Brasil.

No chão e nas paredes das ruas do Centro e das zona Sul, Norte e Oeste, por onde passam milhões todos os dias, estão lembranças de episódios que pavimentaram o caminho do país para a formação do Império, da Proclamação da República, da ditadura militar e, por fim, da democracia.

Confira o infográfico com um pouco da história do Rio Arte O Dia

Cantado em verso e prosa por poetas e compositores, o Rio, mais que cheio de encantos mil, é livro didático aberto há pelo menos 450 anos. A cidade nasceu entre a batalha e a lenda. Foi onde está hoje a Fortaleza de São João, na Urca, que o fundador Estácio de Sá levantou um fortim para garantir os interesses de Portugal na Baía de Guanabara.

Outro marco da fundação é o já destruído Morro do Castelo, no Centro, que supostamente teria guardado valioso tesouro. Nunca encontrado, ao menos serviu de inspiração para cronistas do viver carioca, como Lima Barreto e Machado de Assis.

Do que restou do Castelo, a história política do Rio e do Brasil seguiu pela área central da cidade. Da Praça 15 e seus marcos da presença da família imperial, à Cinelândia, que no passado abrigou cinemas e a sede do Poder Legislativo, poucos quilômetros separam as lembranças de momentos decisivos. O Paço Imperial serviu de local de despachos para o Rei Dom João VI e de cenário para a decisão de Dom Pedro I ficar no Brasil e não voltar a Portugal. Anos depois, foi lá que a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea.

Com a República, proclamada no Campo de Santana, e as reformas urbanas na cidade, surgiram novos cenários políticos, como a Avenida Rio Branco. Na via, que hoje é canteiro de obras, brasileiros comemoraram a chegada de Getúlio Vargas ao poder, em 1930. Também lá condenaram a ditadura na passeata dos Cem Mil, em 1968, e foram para a porta da Igreja da Candelária pedir eleições diretas para presidente, em 1984.

A cidade foi capital do país por quase 200 anos e se consolidou como epicentro dos principais acontecimentos nacionais. O coração de parte daquela época foi o bairro do Catete, local do Palácio onde Getúlio Vargas, com um tiro no próprio peito, decidiu sair da vida para entrar na história.

O Rio perdeu protagonismo político quando a capital foi para o interior do país. Mas a inauguração de Brasília, em 1960, não tirou totalmente a importância da cidade, como argumenta a historiadora da Faculdade de Economia da Uerj Marina Monteiro Machado.

“O Rio continua bastante efervescente. Não é o único centro político do país, tampouco hegemônico, mas grandes acontecimentos seguem aqui, vide os movimentos de junho de 2013, por exemplo. Tudo o que acontece por aqui ressoa em todo país”, afirma ela.

Historiadoras defendem ‘novos olhares’ sobre pontos tradicionais

Visitas ao Palácio do Catete, ao Museu Nacional de Belas Artes ou ao Paço Imperial rendem boas aulas de história. Mas, para além daquilo que é habitualmente mencionado, o Rio guarda, fora dos roteiros tradicionais, outras memórias do Brasil que também devem ser preservadas.

Pela cidade, diversas iniciativas têm sido realizadas neste sentido, como destaca a professora Carina Martins, da Uerj. “A cidade guarda muita informação, mas não é isso que educa. É necessário mediar o conhecimento para que as pessoas consigam perceber as diferentes temporalidades de cada um desses espaços”, acredita a historiadora.

Ela defende “novos olhares” sobre os pontos históricos já “tradicionais” no Rio e uma visão atenta sobre novos locais que conservam memória. “O Museu da Maré guarda memórias de outro Brasil, diferente do Museu Nacional, por exemplo”, opina.

Saindo das repetições de roteiros clássicos, Carina indica que outros bairros da cidade também merecem a atenção dos historiadores, turistas e cariocas. “Não podemos naturalizar o Centro como único espaço educativo da cidade. Inhaúma, Cachambi, diversos outros bairros têm suas memórias.”

A historiadora Marina Monteiro Machado crê que o Rio tem cuidado mal da sua história. “A cada data comemorativa, a mesma trilha se repete: muita memória, saudosismo, e pouca ação prática. Ainda temos muito o que percorrer quando se trata de cuidado com a nossa história”, resume.

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