Por karilayn.areias

São Paulo - Em troca de gravações em áudio em que a travesti Verônica Bolina, de 25 anos, afirma não ter sido torturada nas dependências do 2º DP (Bom Retiro), a coordenadora de Políticas para a Diversidade Sexual do Estado de São Paulo, Heloísa Alves, teria prometido dimuição de pena para a acusada. Essa versão foi relatada por Verônica, nesta sexta, a promotores do Grupo Especial de Controle Externo da Atividade Policial (Gecep), do Ministério Público de São Paulo, que investigam a atuação de policiais no caso.

Verônica ainda contou aos promotores que foi agredida por policiais civis e militares, mas que as agressões que deixaram seu rosto desfigurado teriam sido praticadas por policiais do GOE (Grupo de Operações Especiais).

"Ela disse que a gravação não corresponde à verdade dos fatos. Quando perguntamos porque teria gravado o áudio, ela disse que prometeram auxiliá-la com uma diminuição de pena", diz Luciana Frugiuele, promotora pública do Gecep.

Segundo Ministério Público, Verônica gravou áudio para reduzir sua penaReprodução

Nesta sexta, a travesti foi ouvida por três promoteres de Justiça e por três defensores públicas, que acompanham o caso. Ela já tinha confirmado as agressões aos advogados do Centro de Cidadania LGBT, vinculado à Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania, da Prefeitura.

“[Verônica] declarou à nossa equipe ter sofrido agressões em vários momentos por parte de policiais militares e de 'preto', fazendo referência aos agentes do Grupo Operações Estratégicas (GOE), durante o episódio em que atacou o carcereiro da Polícia Civil por conta de uma troca de cela e no hospital Mandaqui quando do atendimento médico”, informou o órgão da Prefeitura, em nota.

A história de Verônica ganhou destaque no começo desta semana. Presa, no 2º DP, ela teria arrancado um pedaço da orelha de um carceiro com uma mordida e depois foi fotografada, com pés e mãos algemados, os seios de fora, além do rosto desfigurado pelas agressões sofridas. As fotos ganharam repercussão rapidamente e a campanha #somostodasveronica foi lançada no Facebook. Os internautas começaram a levantar a suspeita de que Verônica tivesse sido torturda.

Para afastar essa hipótese, Heloísa Alves divulgou áudio em que a travesti diz não ter sido torturada.

“Não fui torturada pela polícia. Eu simplesmente agi de uma maneira que achava que estava possuída, agredi os policiais, eles só agiram com o trabalho deles”, diz Verônica no áudio. “Eles tiveram que usar as leis deles para me conter. Não teve, de nenhuma forma, tortura. Só fui contida, não fui torturada”, completa.

Ao depoimento de Verônica, segue a voz da coordenadora de Políticas para a Diversidade Sexual. Ela diz que o delegado permitiu que a gravação fosse feita porque “há uma comoção geral” e estão “todos preocupados com a integridade da Verônica, preocupados em saber o que efetivamente aconteceu”. Ela pediu ainda que o áudio fosse repassado e divulgado nas redes sociais.

Em uma segunda gravação, também divulgada por Heloísa, a travesti reforça que não foi torturada e que não que “ser usada para fins políticos”. No entanto, é possível ouvir a voz de uma mulher ao fundo ditando a frase para Verônica.

O iG apurou que Verônica disse aos promotores ter sido orientada sobre o conteúdo do que deveria ser dito nas gravações pela coordenadora. Ela confirma que a voz que aparece no segundo áudio é dela. Aos promotores, a travesti explicou ainda que ficou nervosa e, por isso, foi ajudada pela profissional.

Segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP), Verônica confirmou ao delegado que quando estava presa "expôs a genitália e começou a se masturbar, o que provocou a revolta dos outros presos. Para conter a situação, um carcereiro entrou na cela para retirá-la, quando Verônica o atacou com uma mordida na orelha". Segundo o delegado, ela teria se machucado durante esses conflitos.

O Ministério Público abriu procedimento para investigar a atuação dos policiais que atuaram neste caso nesta quinta-feira. Verônica foi transferida ontem para o CDP Pinheiros 3. Hoje ela foi encaminhada para realização de um novo exame de corpo de delito e foi encaminhada para o Fórum Criminal da Barra Funda, onde foi ouvida pelos promotores.

Câmara cobra Alckmin

A Comissão de Direitos Humanos e de Minorias da Câmara dos Deputados Federais cobrou uma explicação do governador Geraldo Alckmin "sobre as providências adotadas pelo seu Governo, para a rigorosa apuração do ocorrido, com vistas à punição exemplar dos culpados".

A comissão informa ainda que "instaurou procedimento para acompanhar os crimes de tortura, agressão, abuso de autoridade, racismo e homofobia" contra a travesti.

"Nenhum ato que tenha sido praticado pela vítima, em legítima defesa ou não, tem o condão de justificar tamanha violência policial", finaliza.

Verônica foi presa na última sexta-feira (10) acusada de tentar matar uma mulher de 73 anos e agredir outras duas pessoas, segundo a SSP.

O iG procurou a Secretaria de Segurança Pública e a Coordenadoria de Políticas para a Diversidade Sexual, mas não obteve respostas até o fechamento desta reportagem.

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