São Paulo - Pode perguntar: muita gente conhece uma lan house que encerrou as atividades e virou um salão de cabelereiro, ou outro tipo de estabelecimento, no bairro onde mora.
Atropelados pelo maior acesso à banda larga e à compra de computadores e smartphones, bem como a popularização do plano de internet no celular, não foram poucos os empreendedores que desistiram do negócio.
De acordo com dados da Associação Brasileira de Centros de Inclusão Digital (Abcid), de dezembro de 2009 a dezembro do ano passado, cerca de 48 mil estabelecimentos fecharam as portas no Brasil. Antes 108 mil, hoje as lan houses somam cerca de 60 mil – retração de 45% em três anos.
Os empresários aguardam a entrada em vigor da regulamentação para o setor, aprovada em abril de 2011 na Câmara, que irá ajudá-los a se proteger de notificações judiciais devido a uso ilícito da internet no local, e, consequentemente, tentar sobreviver buscando novos serviços e usos para as lojas. O projeto tramita agora no Senado e, caso não seja alterado, será enviado para sanção presidencial.
Apesar de não concordarem com emendas feitas no projeto, como a que obriga que menores de 18 anos sejam cadastrados nos estabelecimentos com o número do RG (os empresários argumentam que são poucos os que têm o documento, e que ele poderia ser substituído pela carteira de estudante), donos de lan house acreditam que o projeto pode ajudar.
Mario Brandão, presidente da Abcid e dono de uma lan house no Rio de Janeiro, define a situação. "Estamos morrendo de fome, e vemos um prato com uma porção de veneno. É melhor tentar comer sem tocar no veneno a morrer".
O projeto também define as lan houses como “centros de inclusão digital”, prevê parcerias com o governo em projetos educacionais e estabelece prioridades para os estabelecimentos em linhas de financiamento para compra de computadores.
Uso ilícito
Segundo Brandão, cerca de 800 lan houses são notificadas judicialmente por ano, e três por dia. A identificação do mau uso é pelo IP (número de identificação do computador na internet) da loja. Como a lan house não consegue identificar o usuário, pois o IP é distribuído pelas máquinas, é caracterizada como a responsável pelo delito.
A multa geralmente é de cerca de R$ 10 mil, valor que pode ser suficiente para fechar um negócio. "A regulamentação exime a lan house de responsabilidades do uso da rede por clientes".
Brandão defende o segmento argumentando que a maioria das atividades ilícitas cometidas com o acesso à internet nos estabelecimentos são crimes contra a honra. "É um que xinga o outro". Segundo o presidente da associação, são poucos os casos de fraude virtual.
Público mais diversificado
As lan houses são hoje frequentados majoritariamente por consumidores das classes D e E, que correspondem a cerca de 90% dos usuários. Apenas a faixa etária mudou: antes concentrada na faixa de 12 a 15 anos, hoje a média de idade dos usuários é de 20 anos.
Brandão lembra que o adolescente que frequentava a lan house para jogar Counter Strike (jogo de tiro popular) com amigos, há dez anos, busca hoje oportunidades de emprego. "As lan houses tiveram que acompanhá-lo".
Não à toa, a mortalidade das lan houses atingiu mais o negócio com foco em jogos online, que não soube se reinventar, e também os bairros mais afastados do centro, que registravam saturação de empreendimentos. Brandão cita como exemplo o bairro da Abolição, próximo ao Estádio do Engenhão, no Rio. De sete lan houses, restaram duas.
"O pessoal abria uma lan porque pensava em ganhar muito dinheiro. E realmente ganharam até 2008. Depois, tiveram dor de cabeça", conclui.
Reportagem Marília Almeida