Por bferreira

Rio - O trânsito caótico e o transporte público deficiente provocam muito mais prejuízos ao Rio do que apenas o aborrecimento diário de seus moradores. Levantamento da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) estima que engarrafamentos na Região Metropolitana custarão R$ 28,7 bilhões à cidade em 2014. A projeção converte minutos perdidos no tráfego em produção econômica e também abrange custos extras com combustível em função do fluxo lento de veículos.

Carros e ônibus congestionados na Avenida Presidente Vargas%2C no Centro do Rio Paulo Carneiro / Agência O Dia

Medição do Instituto Akatu feita nas nove principais regiões metropolitanas do país revela que se o tempo de locomoção do brasileiro até o trabalho fosse limitado a 30 minutos por dia, o país poderia ter ganho de produtividade da ordem de R$200 bilhões. De acordo com o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) a média atual é 82 minutos.

“O ganho de tempo não precisaria ser usado só no trabalho, mas em Educação, Esporte ou qualquer coisa que melhorasse a qualidade de vida das pessoas”, afirma Dalberto Adulis, gerente de Conteúdos e Metodologias do Akatu. “Essas atividades acabam desaparecendo quando estamos presos em automóveis ou entulhados no transporte público”, diz.

As contas não levam em consideração a queda de rendimento no desempenho dos trabalhadores devido a fatores como o cansaço e o estresse, um fenômeno que também começa a ser mensurado. O Akatu estima que quem gasta entre 30 e 60 minutos para ir ao trabalho perde 2,5% em produtividade. Se o tempo ultrapassa uma hora, a queda é de 5%.

Os longos períodos perdidos no tráfego já ganharam até nome em estudos acadêmicos: “poluição do tempo”. O conceito é explicado pelo professor da Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos, Robert Cervero.
“Tempo é um recurso escasso, tanto quanto a terra e o ar limpo. Assim como existe poluição do ar e da terra, também existe essa poluição ”, analisa.

Chegar ao Centro é uma das maiores dificuldades dos usuários de transporte

Moradora de Itaboraí, a agente de turismo Valquíria Cardoso, 24 anos, leva de três a quatro horas por dia para ir de casa ao trabalho. Para cumprir a jornada, acorda ainda de madrugada, por volta das 4h e pega o ônibus às 5h30. Às 17h30, ela começa a viagem de volta. Na quinta-feira, esperou uma hora e meia pelo coletivo, debaixo de chuva. “Nem sei quando cheguei em casa, a novela das nove tinha até acabado”, conta.

O longo tempo de deslocamento se reflete nas tarefas que desempenha na profissão. “O cansaço é imenso, e quando tem um problema como uma chuva, já chego estressada no trabalho”, diz Valquíria, que também não consegue participar dos happy hours com os colegas e costuma perder diversos eventos familiares.

“Queria trabalhar perto de casa, mas onde eu moro não tem mercado para o turismo”, lamenta. Da parte das empresas, a reclamação é sobre a dificuldade de encontrar mão de obra que more na região central. “É quase impossível achar”, afirma Ronnie Arosa, diretor do Pompeu Rio Hotel, onde a maioria dos funcionários vive longe.

A questão da mobilidade foi crucial na decisão do advogado Sérgio Bernardes de deixar o Centro após seis anos. Há um ano, ele levou seu escritório para a Barra da Tijuca. Morador de Ipanema, Bernardes leva cerca de quarenta minutos para chegar ao local, que tem a vantagem de ter estacionamento próprio. “No Centro era impossível achar vagas. Ainda vou até lá para dar aulas na Escola de Magistratura e tenho que pedir para usar o estacionamento do tribunal”, conta.

FIRJAN DEFENDE DESCENTRALIZAÇÃO

Apontado como um dos principais vilões do trânsito, o automóvel não é o fator que mais contribui para os congestionamentos no Rio. Na visão do especialista em Competitividade Industrial e Investimentos da Firjan, Riley Rodrigues, o problema maior da cidade é a concentração de empresas e serviços no Centro, decorrente da falta de planejamento urbano. “O trânsito no Rio é unidirecional, com todos os veículos indo para o Centro”, afirma.

Ele defende que a descentralização dos setores administrativo, financeiro e de comércio seria a solução de longo prazo mais inteligente para reduzir o trânsito. Rodrigues cita a cidade de Los Angeles, que reduziu a média de engarrafamentos de 700 horas/ano para 90 horas/ano.

“Eles deram incentivos tributários para que as funções fossem distribuídas pela cidade e reduziram o trânsito, mesmo com nove milhões de carros”, afirma.

Para o especialista, apesar do investimento em transporte público e em obras viárias ser bem-vindo, ele não resolve o problema. “A cidade é como um corpo. Se há o entupimento de uma veia, coloca-se ponte de safena. Mas, no longo prazo, não resolve. Tem que mudar de hábitos”, sentencia.

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