Rio - O aumento dos casamentos intergeracionais pressiona as contas da Previdência Social, mas até agora o governo não se mobilizou para resolver o problema. O fenômeno, que ficou conhecido como "efeito Viagra”, em referência ao remédio que alonga a vida sexual dos homens, onera o sistema previdenciário, pois os viúvos e viúvas destes casais, bem mais jovens, ganham a pensão por mais tempo do que aqueles que tinham idade similar à do cônjuge falecido. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, em 2003 houve 3.452 uniões entre homens com mais de 60 anos e mulheres com menos de 40. Em 2012 foram 4.546, alta de 31,6%. Quando a diferença de idade cai para 10 anos, o aumento é ainda mais expressivo, de 76,28%.
Em 2013, o Instituto Nacional de Seguridade Social gastou R$ 73 bilhões no pagamento de pensões por morte, mas o órgão não sabe qual é o impacto dos casamentos tardios neste valor. Por mês, cerca de R$ 2 milhões são pagos à viúvos com menos de 40 anos.
Para especialistas, o fenômeno, por si só, não provoca um impacto tão grande dentro da conta bilionária da Previdência. Entretanto, eles afirmam que os casamentos intergeracionais deixam mais expostas algumas regras da concessão de pensões que engordam as despesas, ou seja, são apenas a ponta do iceberg de uma conta que terá que ser alterada em algum momento.
Uma delas é que a Previdência não exige carência para o pagamento de pensões. “Se pessoa faz uma filiação na Previdência e morre um mês depois, o cônjuge tem o direito à pensão pela vida toda”, explica Roberto dos Santos, presidente do Instituto de Estudos Previdenciários. O professor Benedito Passos, do Núcleo Atuarial de Previdência da UFRJ, aponta que, enquanto no Brasil a pensão é vitalícia, países desenvolvidos, como a Dinamarca pagam o benefício a apenas por um tempo. “Lá, a seguridade cuida para que a pessoa faça cursos e possa ter uma readequação de sua renda”, diz ele. “Mas o problema da Previdência é muito maior. Não é culpa dos velhinhos que casam com mulheres mais novas”, afirma. O economista Marcelo Caetano, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), chama a atenção de outras regras polêmicas do sistema de pensões brasileiro: não existe idade mínima para se receber o benefício. É permitido acumular a pensão com a aposentadoria, e a pensão equivale à 100% da aposentadoria. “Para atacar o grosso do problema, seriam necessárias medidas muito impopulares”, pondera. A professora aposentada Marly Dias, 67, é casada com o advogado Ubirajara Rodrigues, 68, mas recebe há 22 anos a pensão do ex-marido, que morreu jovem. Ela acumula o benefício com a aposentadoria que recebe como servidora pública e afirma que não teria problema se a pensão fosse cortada. “Se eu não recebesse, tudo bem, mas para quem depende só dos valores do INSS, pode ser complicado”, afirma.
Em 2012, o Ministro da Previdência, Garibaldi Alves, anunciou que estava estudando alterações no benefício, mas o assunto caiu no esquecimento. Questionado, o Ministério da Previdência Social informou em nota que “por ser um assunto delicado, não está no momento se pronunciando sobre mudanças nas regras das pensões”.
Com diferença de idade de 13 anos, o casal Mário Jorge Azevedo, 58, e a assistente administrativa Sônia Teixeira, 45, são namorados e preferem garantir cada um o próprio sustento a se preocupar com a questão. “Como cada um tem seu trabalho, não dependemos do benefício”, afirma ele.
Fundos têm regras diferentes
Enquanto o INSS adia as mudanças em seu regime de pensões, o sistema de previdência complementar já adota medidas para equilibrar melhor suas contas, diante dos altos custos do pagamento de pensões por morte.
Terceiro maior fundo de pensão do país, a Fundação dos Economiários Federais (Funcef), plano dos funcionários da Caixa Econômica Federal, mudou as regras em 2006. Atualmente, se um aposentado cadastra um conjuge mais novo no plano, o valor de seu benefício é recalculado e jogado para baixo, considerando a expectativa de vida da pessoa que pode vir a ser pensionista. “Ele terá uma dedução no benefício. Se quiser manter o valor, terá que fazer um novo aporte para o fundo”, explica Luciana Freitas, analista sênior na área de concessão de benefícios do Funcef. Além disso, a pensão paga pelo Fundo é limitada a 80% da aposentadoria do titular do plano. Atualmente, 6.964 pessoas são pensionistas do fundo.
Segundo Elisabete Teixeira, diretora de seguridade da Valia, o fundo de pensão dos empregados da Vale, desde os anos 1990 as empresas começaram a migrar para os planos na modalidade de contribuição definida .Este modelo funciona como uma poupança, em que benefício se limita ao aporte que foi feito pelo funcionário durante os anos de contribuição. “Essa tendência apareceu não só por causa do efeito Viagra”, mas pelo próprio aumento na expectativa de vida da população”, explica Elisabete.