Por bferreira

Rio - E a conta vai para... os trabalhadores. A crise do petróleo que reduz os empregos também atingiu em cheio as prefeituras do interior do Rio de Janeiro. Especialmente as localizadas no entorno do Comperj, em Itaboraí. Agora é a vez de as cidades anunciarem o corte nos investimentos. Lá se vai o dinheiro para saneamento básico, abastecimento de água, pavimentação e, em especial, para as creches e postos de saúde. Resultado da queda brusca na arrecadação de impostos, provocada pela redução no ritmo das obras da Petrobras e nas vendas do comércio varejista.

A pavimentação%2C uma das principais reivindicações dos moradores de Itaboraí%2C foi deixada de lado para priorizar a manutenção de alguns serviçosSó 27% da população tem áVitor Silva / Agência O Dia

Quem mais pensava em lucrar com o complexo petroquímico (agora uma refinaria) em Itaboraí é exatamente quem terá a conta mais cara. O município, que em janeiro arrecadou R$ 23 milhões e sonhava retornar ao patamar de 2012 com R$ 38 milhões mensais apurados só com ISS (Imposto sobre Serviço), agora vive a realidade das vacas esquálidas. A arrecadação em fevereiro baixou para R$ 14 milhões e as projeções apontam para apenas R$ 9 milhões este mês. Só com as obras do Comperj, a queda no recolhimento do imposto foi de R$ 18 milhões para R$ 7 milhões.

Restou ao prefeito Helil Cardozo a tesoura afiada. Contigenciou 20% no orçamento de R$ 935,6 milhões do município e não titubeia ao colocar na cabeça dos cortes as obras de infraestrutura. “Não teremos novos investimentos. Pedi para cortar todo o gasto extra, como aluguéis e custos com carro e telefone. Só não mexo com Saúde e Educação. Os demais vão sofrer redução”, admite Cardozo, que sonhava em ver a Petrobras cumprir o cronograma de obras previstos na contrapartida pelo impacto provocado pela construção do Comperj.

Não é coisa pouca. São R$ 911 milhões destinados a ampliar a rede de esgoto, a coleta e distribuição de água e o plantio. Pouco até agora saiu do papel e, pelas informações do prefeito de Itaboraí, nada estará este ano na pauta de obras da Petrobras. O mais urgente seria a barragem no Rio Guapiaçu. Em tempos de crise hídrica, ela reforçaria o sistema do Imunana-Laranjal e o abastecimento de sete municípios — entre eles, dois gigantes populacionais e com severa crise no abastecimento: São Gonçalo e Niterói. O custo previsto é de R$ 248 milhões, mas só foram gastos até hoje R$ 60 milhões — com projetos. Em Itaboraí, hoje apenas 27% dos domicílios têm água encanada.

Outra ponta de investimentos parada desde a explosão da crise é o saneamento básico. A previsão era gastar R$ 88 milhões em Itaboraí e outros R$ 60 milhões em Maricá com a coleta e o tratamento de esgoto em centenas de ruas. Quase todo o dinheiro foi gasto e os aditivos necessários para concluir o serviço estão trancados na gaveta da Petrobras. “Não consigo saber como está o andamento. Sei que as obras estão paradas. Tem até água parada, o que é um perigo, numa das estações da elevatória”, alerta Helil Cardozo.

A vizinha Tanguá apostava no aumento da arrecadação do IPTU com as novas construções que surgiram no muncípio após a chegada do Comperj. A crise adiou os planos da explosão imobiliária e ainda deixou uma conta amarga: aumento de 40% nos gastos da Secretaria de Promoção Social com a distribuição de cestas básicas aos operários que perderam o emprego.

CIRURGIAS SIMPLES CANCELADAS EM MACACU

A crise nos municípios em torno do Comperj é tão severa que impede a manutenção de projetos até mesmo em áreas fundamentais para a população como Saúde e Educação. Marcelo Soares, secretário de Fazenda de Rio Bonito, tem quebrado a cabeça para equilibrar as combalidas finanças do município. Para o próximo mês, ele já antevê um problema: a prefeitura não terá dinheiro para pagar a empresa terceirizada que presta o serviço de coleta de lixo. A saída, então, será usar o dinheiro arrecadado com o IPTU para garantir a cidade limpa, verba que seria usada na construção de novas creches. “Está faltando recurso para tudo no município”, resumiu o secretário.

O vazio dos cofres já fez o prefeito de Cachoeira de Macacu, Cica Machado, tomar medidas firmes para conter gastos. Os primeiros a sentir foram os estudantes universitários: o transporte gratuito garantido pela prefeitura diariamente para mais de 1.000 pessoas foi reduzido. “Eram 13 ônibus, levando os estudantes para faculdades fora do município, em Niterói, São Gonçalo e Nova Friburgo. Agora, apenas sete levam os alunos. O resto...”, lamentou.

A área de Saúde também foi afetada: cirurgias simples, como para remoção de apêndice, não têm sido feitas no município. “A reforma de praças, quadras e ginásios também está suspensa. Falta dinheiro em caixa”, explicou Cica Machado.

Em algum momento, a Prefeitura de São Gonçalo chegou a pensar no Comperj como trampolim para deixar de ser apenas o segundo maior município do estado em população. Não deu certo: desde janeiro, o prefeito Neilton Mulim iniciou cortes de gastos e de custeio na administração.

A necessidade de economizar, anunciada desde o primeiro dia do ano pelo governador Luiz Fernando Pezão, foi incorporada também pela administração gonçalense: com as quedas previstas para todo o ano de 2015 na arrecadação do ICMS e no repasse dos royalties do petróleo, a cidade diz que irá manter “a qualidade dos serviços” ao mesmo tempo em que “enxugará a máquina pública.” Agora é esperar (e torcer) para a conta fechar.

Participaram desta reportagem Caio Barbosa, João Antônio Barros, Leandro Resende, Luísa Brasil e Nonato Viegas

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