Rio - A invasão de embalagens coloridas e propagandas de personagens populares, como a porquinha Peppa ou a rainha Elsa, do desenho Frozen, mexe com o imaginário das crianças e com o bolso dos pais. Em um movimento que rema contra essa avalanche de publicidade, famílias, blogs e entidades de defesa dos direitos da criança e do consumidor têm levantado a discussão sobre o consumo consciente durante a Páscoa e incentivado o boicote aos ovos licenciados com temas e brindes de personagens. O cenário econômico de aperto no orçamento das famílias também estimula alternativas como a confecção de ovos em casa ou a compra de produtos artesanais.
A discussão ganha força justamente um ano após a publicação da resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) que considera abusiva a publicidade dirigida a crianças. “A resolução identificou uma proibição que já existia no Código de Defesa do Consumidor. Qualquer produto alimentício que coloca o elemento infantil para atrair está fazendo uso da falta de experiência da criança para atraí-la”, afirma Desirée Ruas, integrante da Rede Brasileira Infância e Consumo (Rebrinc).
Segundo a psicóloga Laís Fontenelle, do Instituto Alana, os produtos da Páscoa estão entre os mais apelativos para as crianças. “O primeiro fator de influência na compra é a publicidade. Depois vem o personagem e a embalagem. Nos ovos de Páscoa, essas três coisas andam juntas. O desejo por aquele objeto é imediato”, afirma.
Apesar da publicação da resolução, a venda de produtos licenciados continua à toda no país. Por isso, a iniciativa para sair do ciclo de publicidade infantil costuma vir dos próprios pais. É o caso de Tatiana Silva, 33 anos, que trabalha com oficinas infantis. Em sua casa, ela costuma promover brincadeiras com o filho, Acauã, de 3 anos, durante a data. “Ano passado, a gente pintou os ovos de galinha. Meu filho não come muito chocolate, então fiz uma mistura de banana com cacau”, afirma ela.
A secretária executiva Thaís Quitete, 28, apostou em ovos artesanais produzidos por uma prima. A embalagem e a decoração do chocolate serão feitas por ela e a filha, Sophie, também de 3 anos. “É uma oportunidade de fazer uma atividade diferente com ela. Acho um abuso o que os fabricantes fazem. Além do preço absurdo, colocam brindes para cercar os pais de todas as maneiras. Para não verem a criança chorando, eles acabam comprando”, diz.
Para Laís, a posição dos pais é importante para promover uma Páscoa mais consciente, mas ela diz que o estado tem que fazer valer a proibição da publicidade infantil. A Abicab, associação que representa os produtores de ovos industrializados, não se posicionou sobre o assunto.
Brinde é anunciado como gratuito, mas sai caro no preço final do ovo
Um levantamento feito pelo Movimento Infância Livre do Consumismo mostra que os brindes que vêm nos ovos de Páscoa custam caro para os pais (o levantamento completo está disponível no site milc.net.br/tag/pascoalivre).
Na comparação entre 30 ovos do mesmo fabricante, a grama do produto varia entre R$ 0,11 a R$ 0,15. Já nos ovos infantis com brinquedo o valor fica entre R$ 0,18 e R$0,25. No preço final, os ovos infantis podem ficar até R$ 20 mais caros que outros similares do mesmo tamanho.
“Ovos com brindes sempre existiram. Mas hoje isso salta mais aos olhos porque os brinquedos chamam mais a atenção que o chocolate”, diz a psicóloga Laís Fontenelle.
O ovo caseiro é uma solução mais barata para os pais. A professora do curso de Gastronomia do IBMR, Maria de Lourdes de Andrade, afirma que com R$ 10 é possível produzir um ovo de meio quilo completo, com embalagem e feito de chocolate de média qualidade (encontrado em supermercados). Ela afirma que a produção acaba se tornando uma fonte de renda para muitas pessoas. “Vejo senhoras de mais idade que entram no curso, começam a vender e acabam conseguindo uma profissão com a idade já avançada”. Maria de Lourdes irá ministrar um curso gratuito sobre ovos na quinta-feira. Mais informações no site www.ibmr.br.