Por bferreira

Rio - Ao assumir a presidência da Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de Janeiro (Faetec), em janeiro de 2015, uma das primeiras providências que Wagner Victer tomou foi montar uma pequena plantação de pimentas no jardim que fica em frente à sua sala. “É para tirar o mau olhado. Em todo lugar que trabalho, planto minhas pimentas”, explicou. Desde que saiu da Cedae, empresa que presidiu por oito anos, o engenheiro comanda a fundação, que atende 300 mil estudantes e possui orçamento anual de mais de R$ 800 milhões.

Wagner VicterCarlo Wrede / Agência O Dia

Para Victer, o grande desafio de sua gestão é aproximar o ensino das demandas do mercado. Entre os projetos prioritários para este ano, estão a inauguração de uma unidade na Maré e a formação de mão de obra para os Jogos Olímpicos. Fã inveterado da franquia de cinema Guerra nas Estrelas, ele diz estar feliz no segmento de Educação, onde pode passar os conhecimentos adquiridos nos anos de experiência e aplicar a “filosofia Jedi” à administração pública. “Chega um momento da vida em que você tem que passar seus conhecimentos. Isso é a filosofia Jedi. Há os Padawans, e cada um deles tem um mestre Jedi para orientá-los”.

O DIA: O senhor assumiu a presidência da Faetec há cinco meses. Neste período, o que foi definido como prioridade? O governador fez algum pedido específico quando te convidou para o cargo?

WAGNER VICTER: Cheguei na Faetec com o desafio de aperfeiçoar o que tinha de bom e avaliasse que não estava alinhado às melhores práticas. Mas a Faetec é muito bem organizada. O grande pedido do (governador) Pezão e do próprio Gustavo (Gustavo Tutuca, secretário estadual de Ciência e Tecnologia) é aproximar a Faetec do mercado. Ela é uma fundação fantástica, com milhares de professores, mais de 100 unidades, e nunca tinha tido um engenheiro como presidente, mesmo sendo vocacionada para o ensino técnico.

E como fazer essa aproximação?

A gente começou com trabalhos diários. Essa semana ocorreu aquela explosão de São Conrado, e eu já entrei em contato com o presidente da CEG oferecendo a Faetec para cursos de novos inspetores de gás. Também entrei em contato com a Guerin, uma grande padaria que está reabrindo e contratando padeiros da Faetec. Estamos fechando uma acordo com o Rio 2016, para treinar mão de obra para ser usada durante os Jogos Olímpicos. Vai haver um complexo de pessoas trabalhando como copeiras, cozinheiras, e vamos assinar um acordo em breve com o Pezão.

O IBGE divulgou os dados de desemprego na quinta-feira, mostrando que a taxa tem crescido mais entre os jovens. Entre a população de 18 a 24 anos, está em 16,2%. Qual é o papel da Faetec neste cenário?

Quando tem crise, a grande oportunidade é investir em qualificação. Não há dúvida que essa é a grande saída. A Faetec treina jovens a partir dos 14 anos de idade. Desde que entrei aqui, já oferecemos mais de 100 mil vagas para cursos de qualificação, a maioria para jovens. Só em UPP foram 15 mil vagas. Estamos finalizando uma unidade na Maré até o final do ano. Ela será um centro específico para soldas. Terá desde técnicos de nível médio de solda a cursos de soldadores.

Essa inauguração de uma unidade no Complexo da Maré vem em um momento em que o projeto das UPPs está sendo muito questionado. Foi prometido uma polícia comunitária com a chegada de serviços que, muitas vezes, nunca chegaram...

A gente está dando uma resposta rápida. Em junho vamos fazer uma formatura no Complexo do Alemão, com 2.500 pessoas qualificadas. Meu envolvimento é tão grande que até meu cabelo eu corto nos cursos. Eu sirvo de modelo para os alunos. Já cortei na unidade de Quintino e na Ilha do Governador. E digo mais, os alunos não devem nada ao Werner, onde eu cortava antes.

Em termos de frequência, há problemas de evasão nos cursos?

Há. Esse é um problema que a gente tem reorientado. Havia uma série de empecilhos que levavam à evasão. Estamos fazendo um processo de acolhida dos alunos para reduzi-la.

O senhor tem exemplos de alguma ação concreta?

Sim. Os cursos de salgadeira exigiam cursos prévios de Matemática e Português. Às vezes, as alunas são senhoras de 60 anos que querem abrir um negócio. A pessoa fica constrangida em voltar a fazer uma prova de Matemática. Agora não vai precisar mais. Outro exemplo: os jovens dos cursos técnicos só podiam fazer estágio a partir do terceiro ano. No modelo alemão, é liberado a partir do primeiro período. Isso nós também modificamos.

O governo do estado está com problemas de caixa. Como está o orçamento da Faetec? Isso afetou vocês também?

Não houve corte para a Faetec, o Pezão tem nos privilegiado. Temos um orçamento superior a R$ 800 milhões por ano. O que teve foi contingenciamento, mas a Secretaria de Fazenda e o Pezão tem descontingenciado seletivamente quando peço. Tenho uma grande vantagem ali. Primeiro porque Pezão é meu amigo. Segundo porque o Tutuca é meu amigo e é tricolor. E o Julio Bueno (secretário de Fazenda) é meu amigo e tricolor também. Nós três vamos aos jogos juntos. Então eu tenho um entrosamento natural.

Fica mais fácil passar o pires desta forma?

Muito mais fácil, é uma coisa entre tricolores (risos).

E como está a situação dos terceirizados da Faetec? Em vários órgãos do estado, funcionários de apoio, como a limpeza, estão com salários atrasados.

Não está atrasado. Está em dia. Tivemos alguns ajustes de redução, adequando ao decreto do governador, mas nada significativo. E quanto aos professores, estamos mantendo o quadro e chamamos mais de cem professores concursados, que estavam com o prazo da seleção vencendo.

O senhor tem acompanhado a discussão do PL 3.440 (o projeto regulamenta a terceirização e libera a subcontratação em atividades-fim de empresas)? Acha que essa regra deveria ser aplicada na Administração Pública?

Na Cedae, eu reduzi os terceirizados em 80% e a empresa ficou mais moderna. Acho que a atividade regular não pode e não deve ser terceirizada. Um curso que é regular e permanente você não tem que terceirizar, pois aquilo vai ser perene. Mas muitas vezes você cria cursos que acabam rápido. Se você chega numa unidade do interior em Laje do Muriaé, por exemplo, com duas ou três rodadas do curso, você já acabou com a demanda da cidade. Cursos de qualificação e CVTs têm aulas de criação e extinção muito rápidas e não precisam de professores concursados. Os permanentes, aí sim você tem que ter os concursados. Esse equilíbrio é fundamental. Não se terceiriza o que é continuo e o que é regular, e sim o que é pontual.

O Ensino Técnico é historicamente desvalorizado no Brasil, com a cultura de que as pessoas só ascendem na vida profissional se forem para a universidade. Qual é sua visão sobre isso?

Eu sou o melhor exemplo da importância do Ensino Técnico. Minha mãe é técnica, formada na primeira turma da Escola Técnica de Química. Eu, antes de ser engenheiro, fiz curso técnico e meu filho vai fazer prova para curso técnico. O técnico ou a qualificação é a grande sacada para a virada do Brasil. Nos Estados Unidos, eles fizeram os “community colleges”, que oferecem formações técnicas em Nível Superior, com duração de dois anos.

Mas o senhor acha que ainda há preconceito com o curso técnico ou esta visão está mudando?

Durante muito tempo houve preconceito e uma visão conservadora em diversas áreas de RH achando que o profissional obrigatoriamente tem que ter curso Superior. É bom ter curso Superior, mas ele não se choca com o técnico.

Qual é o andamento da demandas dos servidores da Faetec, como a implementação do plano de carreira e a realização dos concursos?

Quando cheguei, encontrei sistemas de informática para gestão acadêmica que foram desenvolvidos no passado e não foram implementados. Vamos implementar agora, para identificar as demandas e fazer os concursos. Antes de abrir concurso, é preciso ter governança que demonstre claramente essa necessidade. A ideia é implantar o portal nos próximos oito meses.

E o plano de carreira?

Ele foi aprovado no ano passado e agora vamos conversar para que ele possa ser implantado. Já conversei com a Claudia Uchoa (secretária estadual de Planejamento), porque o plano requer uma regulamentação.

Como estão as obras da Cordon Bleu (uma filial carioca da renomada escola de gastronomia foi anunciada em 2011, com a previsão de começar a operar em 2012, mas até hoje não houve a inauguração)?

Recebi recentemente o dono da Cordon Bleu e ele ficou impressionadíssimo com o projeto. A obra está praticamente pronta, na fase final de instalação de ar-condicionados. Quando abrir, 20% das vagas vão ser para pessoas pobres.

Qual será o critérios de entrada dos bolsistas?

Tem que ter um processo que leve muito em consideração a vocação, a capacidade de mudar a vida da pessoa e o poder aquisitivo dela. E haverá uma grande sacada. Já identificamos mais de 20 produtos do interior do Rio para serem colocados no cardápio do restaurante onde eles vão treinar. Tem o Palmito de Varjão, o Doce de Leite de Itaocara, que dizem que é melhor que o do Uruguai. A gente vai desenvolver o interior. Tem também a jabuticaba de Varre e Sai. Imagina os franceses falando “jabuticabá”?

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