Por marcelle.bappersi

São paulo - O cenário de crédito escasso, inflação alta e reajustes significativos em tarifas públicas – como água e energia elétrica – vem mudando o estilo de vida da classe C. Acostumada a consumir em condições opostas às citadas, o que os fez subirem de patamar principalmente no período entre 2008 e 2010, a nova classe média agora se vê obrigada a pisar forte no freio.

Os dados que mostram uma economia débil fazem desta crise a mais grave desde que a classe C (famílias com renda familiar de até R$ 2,9 mil) passou a ser reconhecida. Por conta disso, a adaptação às reduções nos custos vem sendo mais penosa para os mais jovens, que começaram a ter de arcar com as despesas mais recentemente.

Como a atual crise afeta a nova classe C%3FMarcelo Camargo / ABR

“Quem viveu a crise em 2008 já tem um histórico que possibilita aprender a se virar com mais facilidade. Hoje, quem está sentindo a crise com uma força muito maior são os jovens, mas eles também já estão aprendendo a lidar com a redução de custos e buscando fontes alternativas de renda”, explica o presidente do Data Popular, Renato Meirelles.

Um exemplo da mudança de hábito é Júlia Mariano, de 27 anos. Moradora de Paraisópolis, zona sul de São Paulo, ela é cabelereira, mora com a única filha pequena e toca com o irmão um pequeno salão de beleza ao lado de casa. No entanto, sentindo os efeitos principalmente dos reajustes nas contas de água e energia elétrica, ela deixou a exclusividade do seu empreendimento e passou a fazer serviços avulsos para complementar a renda. “Só o salão não dá. Às vezes, quando aparece durante a semana, eu faço bicos de diarista”, contou.

Para Júlia, os reflexos da queda de 5% na massa de rendimento real do trabalhador nos últimos 12 meses vieram na forma das contas de água, luz e de supermercado. Com os seguidos reajustes nas tarifas, algumas contas chegaram a dobrar de valor. Como resultado, atualmente cerca de 80% de sua renda mensal é destinada para pagar despesas básicas, incluindo alimentação, e gastos pontuais com roupas. “Antigamente eu ia ao mercado com R$ 60 e comprava muita coisa. Hoje em dia, eu vou com R$ 200 e ainda falta”, diz. Além do aumento das despesas, Júlia passou a ter dois novos hábitos: muita pesquisa e mais pechincha.

O encolhimento do poder de compra da nova classe média e a maior consciência do consumidor refletem no resultado do comércio, que já fecha o quarto mês consecutivo em queda e apresenta retração de 4,5% na comparação de maio deste ano com o mesmo mês do ano passado, segundo o IBGE.

O segmento que puxou a nova baixa foi justamente a dos principais bens consumidos em exaustão pela chamada nova classe média no histórico recente. A última Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) mostrou uma queda recorde (-18,5%) para o mês na compra de móveis e eletrodomésticos. Até então, o pior fluxo de vendas da série histórica tinha sido em 2003 (-10,7%).

“A diminuição da renda e do crédito foram os principais fatores da queda, que tem um histórico positivo de vendas no período”, explica a gerente de Serviços e Comércio do IBGE, Juliana Vasconcellos. O feriado do Dia das Mães, lembra, não foi suficiente para garantir crescimento do setor.

Além disso, a pesquisa mostrou retração de 2,1% no volume de vendas do segmento de supermercados e produtos alimentícios. “Esse [segmento] é outro que serve como exemplo do forte impacto no poder de compra das famílias de menor renda”, diz a especialista.

Força de consumo que faz falta

Para pessoas como Júlia, idas ao shopping e ao supermercado ficaram mais criteriosas em função da pesquisa de preços, mas também são agora uma prática mais rara. Segundo estudo divulgado no início do mês pela Kantar Worldpanel Brazil, a classe C está indo duas vezes menos ao chamado "ponto de venda" (PDV) e reduziu o volume de consumo em 10% na comparação entre os primeiros trimestres deste ano e de 2014. Representando mais da metade da população brasileira, ela é a principal força responsável pela desaceleração do consumo. “Um impacto menor na Classe C, em comparação com outras classes, é mais representativo para a economia”, explica a diretora de contas do grupo, Aurélia Vicente.

Vão menos às compras, pechincham cada vez mais. No entanto, estão gastando um pouco mais – 1% ainda de acordo com o estudo. “O aumento nos gastos se deve exclusivamente pela alta de preços, que impacta mesmo com a redução no volume de compras e na frequência de ida [ao PDV]”, completa a especialista.

As informações são do reporter Luis Philipe Souza

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