Brasília - O uso das tecnologias em sala de aula – considerado um caminho sem volta por especialistas em educação – depende essencialmente dos professores para dar certo. Por isso, eles se tornaram o grande alvo dos programas atuais do Ministério da Educação para promover o aproveitamento de ferramentas tecnológicas nas escolas.
Das primeiras experiências com a distribuição de laboratórios de informática à mudança de estratégia depois do projeto piloto do Um Computador por Aluno, a formação de professores para o tema não perdeu força. O Programa Nacional de Tecnologia Educacional (Proinfo), que centraliza as estratégias do governo federal na área, capacitou 644.983 docentes desde 2008.
De acordo com o Ministério da Educação, todos os cursos solicitados por estados e municípios para capacitação de educadores para o uso de tecnologias em sala de aula continuam sendo financiados. Só este ano, a expectativa é de que 4,9 mil professores façam os cursos, ministrados em 845 Núcleos de Tecnologia Educacional estaduais.
As experiências – bem sucedidas ou não – mostraram que, se o professor não se apropriar das tecnologias e perceber os ganhos reais para a prática pedagógica com as ferramentas, elas se tornam apenas um amontoado de caixas nas escolas. Para o professor Gilberto Lacerda, do Departamento de Métodos e Técnicas da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB), o professor é o ator central do processo de inserção das tecnologias na escola.
“Mesmo que todos os alunos tenham computadores, se o professor não é capaz de fazer uma relação educativa consistente do seu trabalho e as ferramentas, nada funciona. O professor é o elemento mais importante, porque ele é quem dá o sentido pedagógico às coisas. Qualquer recurso tecnológico tem de ser dominado por ele primeiro”, afirma o pesquisador.
Tablets para docentes
Desde 2012, o MEC passou a investir em outra iniciativa para modernizar a sala de aula: os tablets. Os equipamentos portáteis, com tela de 7 ou 10 polegadas, têm visor multitoque, câmera e microfone embutidos e serão distribuídos para os professores. Quando chegam às mãos dos docentes, já estão carregados de materiais multimídia.
“Estamos distribuindo tecnologias que, integradas, podem facilitar o dia a dia do professor. O tablet dá acesso a conteúdos digitais e mobilidade”, garante a diretora de Formulação de Conteúdos Educacionais do MEC, Mônica Gardelli Franco. Junto com os tablets, a proposta prevê a entrega de lousas eletrônicas, que possam se comunicar com os equipamentos do professor, ou computadores e projetores.
Os primeiros professores a receber os tablets serão os do ensino médio. Até julho de 2013, o governo federal bancou 378 mil equipamentos e os estados adquiriram outros 347 mil. Só o MEC investiu R$ 115 milhões. Da mesma forma que no UCA, o ministério realizou um pregão nacional para ajudar estados e municípios interessados em espalhar os equipamentos para professores de outras etapas ou até para alunos a baratear custos com a aquisição.
Para participar da primeira leva de distribuição dos tablets financiados pelo governo federal, as redes de ensino precisavam contemplar escolas urbanas de ensino médio, ter internet banda larga, laboratório do Proinfo e rede sem fio (wi-fi). Os contratos são assinados pelas próprias empresas e as redes estaduais de ensino e o tempo de entrega depende disso.
Dados do ministério mostram que, no primeiro semestre, 275 mil tablets foram distribuídos às redes. Entre a compra e a entrega, é exigido um tempo para carregamento de materiais didáticos nos equipamentos e dispositivos de segurança. Além da formação já oferecida pelo Proinfo, a partir do segundo semestre, o MEC vai abrir um curso de especialização de 360 horas em Educação para Cultura Digital.
Dentro e fora da sala de aula
Uma pesquisa divulgada em maio deste ano pelo Comitê Gestor da Internet quebrou um dos grandes mitos ainda usados como argumento para explicar o pouco uso de tecnologias na sala de aula: a falta de conhecimento do professor. Segundo o estudo TIC Educação 2012, que entrevistou 1,5 mil professores de 856 escolas de todo o país, os docentes utilizam sim a internet em suas atividades diárias e reconhecem benefícios na utilização desses materiais.
Grande parte das dificuldades, reconhecidas pelos próprios professores e apontadas pelos pesquisadores, está na adaptação do uso das tecnologias às rotinas. “Professores são cidadãos de dois mundos: usam as tecnologias fora da escola, frequentam blogs, redes sociais e, dentro da escola, não sabem como usá-las de maneira pedagógica”, afirma Lacerda.
Na opinião de Marcelo Pinto de Assis, formador do Núcleo de Tecnologia Educacional de Taguatinga, no DF, responsável pela formação dos professores, seria importante ter coordenadores para auxiliar os docentes na elaboração de atividades em todas as escolas. “A aprendizagem e a utilização melhorariam muito”, diz.
Em um dia de formação de educadores da rede do DF, professores relataram ao iG que entendem a importância da tecnologia para “não fugir da realidade dos alunos”. Mas admitiram que ainda não veem quais as diferenças entre o notebook – que haviam recebido há pouco tempo – e os tablets no cotidiano escolar.
“Na sala, o tablet não funciona. A internet é lenta, ele é lento, não conseguimos baixar os aplicativos. O que ganhei está guardado, porque já tenho notebook. Não conheço ninguém que está usando em sala”, afirma a professora Ana Lúcia Bontempo, do Centro de Ensino Médio de Taguatinga Norte (CEMTN).
Falhas na formação
Lacerda critica a falta de disciplinas, ainda dentro dos cursos de graduação, que preparem os professores para esse novo mundo. Lacerda ressalta que, enquanto governos mudam políticas, distribuem diferentes tecnologias às escolas, os currículos dos cursos de graduação se mantém os mesmos.
“Os professores em exercício não foram preparados para usar tecnologias digitais em sala e os que ainda estão na graduação também não estão sendo preparados. A educação continuada não resolve uma falha de formação inicial. As faculdades de educação das universidades deveriam ser verdadeiros laboratórios de inovação pedagógica”, critica.
Na pesquisa do Comitê, os professores entrevistados apontam as mesmas críticas. Apenas 44% deles disseram ter cursado alguma disciplina sobre uso do computador e internet e 79% afirmaram que o apoio para o desenvolvimento dessas habilidades vem de outros educadores e leitura. Quando há resistências dos docentes, os argumentos são a falta de tempo e o medo de eles terem menos conhecimento da ferramenta que os alunos.
Eliane Carneiro, coordenadora de mídias educacionais da Secretaria de Educação do Distrito Federal, conta que as formações oferecidas na rede são voluntárias. A proposta dos encontros, organizados pelos NTEs, é ajudar o professor a adaptar as ferramentas aos componentes curriculares.
Este ano, no DF, foram distribuídos 3.051 tablets para os professores do ensino médio. Para aproveitar todas as funcionalidades, Eliane reconhece que é preciso melhorar a infraestrutura das escolas, especialmente de internet, e adquirir telas interativas para as salas de aulas. “Há professores usando os equipamentos em sala, mas ainda é muito pessoal. Precisamos de mais tempo para colher resultados”, pondera Eliane.