São Paulo - Acordar cedo, ficar na sala de aula durante horas e enfrentar uma maratona de provas. Pode parecer o dia a dia de muitos estudantes que estão terminando o ensino médio, mas essa é também a realidade de muitos brasileiros mais velhos que decidiram perseguir uma nova carreira profissional.
O número de pessoas com mais de 35 anos que prestarão a prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) chega a 627.675, 9% do total de candidatos a prova. Os dados são do perfil do candidato do Enem 2013, divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão do Ministério da Educação (MEC).
Para o coordenador do cursinho da Poli, Gilberto Alvare, o Giba, esse quadro é notado entre os alunos do curso pré-vestibular. “A gente percebe a cada ano que o número de pessoas com uma maior idade aumenta. Ainda assim, esse número está bem abaixo dos mais novos, mas eu diria que chega a 10%", diz.
"Agora com o Enem, eles percebem novas possibilidades e que não está tarde para tentar. É uma faixa etária que volta a sonhar com a universidade”, completa Giba. O coordenador lembra ainda que o Enem está sendo usado no programa Ciência sem Fronteiras, então muitos universitários estão prestando o exame.
Para Giba, mesmo com o tempo longe da escola, os alunos costumam ser bem focados e dedicados na hora de estudar. “Esses alunos tem um repertório cultural grande. Claro que essa questão independe da idade, mas são pessoas que leram mais revistas ou livros, que criaram um bom repertório. Que tem um conhecimento maior”, explica.
Além disso, ele diz, os candidatos mais velhos costumam ficar menos nervosos na hora da prova. “Uma coisa interessante é que a pessoa que vai calma para a prova, costuma se sair melhor. O vestibular é um teste de resistência, física mesmo, então o aluno não pode estar muito ansioso. E a idade traz mais maturidade e controle de ansiedade, isso pode ajudar na hora da prova”, completa.
Elas vão prestar o Enem
Após anos longe da escola, Iri Kreutz Binko, 55, moradora de Prudentólis (PR), decidiu prestar o Enem para tentar uma vaga em medicina veterinária. “Meu esposo faleceu em janeiro e isso me impulsionou mais. Mas minha intenção já era voltar a estudar. Agora tem o Enem, se eu tirar uma boa nota posso conseguir entrar em uma faculdade. Vale muito a pena”, diz.
Iri conta que trabalha em sua casa, mexendo com objetos de madeira. “Antigamente, tínhamos uma firma, que fazia principalmente cabos de vassoura, tinha máquina e tudo. Hoje é mais um trabalho manual, quando as pessoas pedem, eu faço algumas coisas na madeira, como cadeiras, em casa mesmo”, completa.
Para estudar, ela tem buscado as matérias através de livros e também pela internet. “Hoje a internet favorece bastante. Minha filha também tem me incentivado bastante. De madrugadinha, durante o dia, eu leio e dou uma estudada. Gosto muito de leitura e me faz bem”, conta. A filha, por sinal, de 26 anos e já formada em filosofia, também deve prestar o Enem.
“Eu acho que nunca é tarde. Agora é o meu tempo. No fundo você almeja mais da vida. E depois, eu 55 de idade e a perspectiva de vida não é mais 60 ou 70 anos, imagina, eu posso ir até 100 anos. Então eu quero fazer um investimento, pensar em ter minha própria clinica”, conta.
Jane Batista Costa, 45 anos, também resolveu enfrentar os estudos novamente para tentar uma vaga na universidade. Com o sonho de fazer psicologia na Universidade de São Paulo (USP), ela diz que vai prestar o Enem para testar seus conhecimentos.
"Eu prestei o Enem ano passado e ele me impulsionou a fazer novamente. Fiquei mais de dez anos sem estudar e achei a prova muito boa. Vi que ele abre portas para muita gente, dá para entrar em muitas faculdades com ele, então a prova nos ajuda a sonhar", conta.
Apesar de prestar o exame nacional, Jane diz que sua vontade mesmo desde criança é passar na USP (o Enem não é usado na nota da USP) e, mesmo que não passe esse ano, vai continuar tentando. Para alcançar o sonho, se inscreveu em no curso pré-vestibular da Poli, onde estuda todas as tardes. "Meu sonho mesmo era a psiquiatria, mas sei que é muito difícil, então quero fazer psicologia. Se eu não alcançar, eu vou fazer filosofia".
Quando não está estudante, Jane, que mora em Franco da Rocha e tem um filho de 26 anos, dá aulas de reforço de caligrafias. No restante, tenta focar nos estudos, o que, segunda ela, a idade ajudou.
"Não era o momento ideal [para fazer faculdade] quando terminei a escola. Eu fiquei mais concentrada, as coisas ficaram mais fáceis para mim, passei a estudar melhor, ler mais livros. A idade me deu mais responsabilidade. O meu momento é agora", completa.
Com 29 anos e já trabalhando como técnica de enfermagem, Lucilene da Silva Maciel resolveu que quer realizar um antigo sonho: virar médica. Aluna do cursinho Henfil, neste ano, ela vai fazer o Enem pela segunda vez e usar a nota para tentar uma bolsa pelo Programa Universidade para Todos (Prouni). "É um sonho antigo. Eu entrei na área da enfermagem, achando que ia dar para pagar por uma faculdade, mas os cursos de medicina são muito caros", diz.
Com a possibilidade do Enem, porém, ela viu uma nova chance para realizar o sonho. "Hoje tem bastante coisa, muito jeito de entrar na faculdade. Tem o Prouni, o Sisu, tem muito mais chance", completa. Como Jane, ela diz que hoje tem mais maturidade para acompanhar as matérias. "Hoje dou muito mais valor aos estudos", conta.
As informações são de Julia Carolina