Por tamyres.matos

Rio - Há exatos 70 anos, surgia o primeiro escrito sobre o autismo, na Áustria. Hoje, diversas são as referências ao transtorno presente em dois milhões de pessoas no Brasil. O assunto está na novela das nove, ‘Amor à Vida’; será abordado em quadro do Fantástico que estreia hoje; e é tema de livro a ser lançado na Bienal do Rio, no fim do mês. Para especialistas, a exposição ajuda no tratamento e na superação do preconceito.

Personagem de Bruna Linzmeyer na novela, Linda apresenta nível grave do autismo e pouca autonomia. Após ajuda profissional, os avanços da menina foram arrumar a cama sozinha e não urinar enquanto dorme. Os obstáculos à superação do mal, porém, são a ‘superproteção’ materna e os maus tratos da irmã.

Foram nove meses de preparação. Além de filmes e livros, Bruna conviveu com autistas. “Existe preconceito por desconhecimento. Falar sobre autismo e sobre as pessoas que conheci é dar voz a elas”, avalia a atriz.

Em ‘Amor à Vida’%2C Bruna Linzmeyer vive uma autista superprotegida pela mãe e que tem a forma grave do transtornoJoão Laet / Agência O Dia

Presidente da Associação de Apoio à Pessoa Autista, Emanoele Freitas, considera autêntica a representação da atriz e conta que, após cada episódio, recebe mensagens de mães de autistas. “Algumas veem na atriz as atitudes dos filhos. Outras se reconhecem na mãe de Linda”, conta.

Segundo Estevão Vadasz, coordenador do Ambulatório de Autismo do Instituto de Psiquiatria da USP, na vida real, Linda não teria muitos avanços. Em casos severos, como o dela, o trabalho deve ser precoce. “Diagnóstico e tratamento devem ser na infância. Há crianças que começam o tratamento com um ano”, explica.

UNIVERSO PARTICULAR

Estruturado em quatro episódios, o quadro ‘Autismo: Universo Particular’, do médico Dráuzio Varella, vai abordar sintomas e diagnóstico do transtorno, além dos direitos dos portadores. O quadro trará pessoas recém-diagnosticadas e adultos que conseguiram driblar os limites da comunicação impostos pelo autismo.

Dificuldade de comunicação é um dos sinais que aparecem até os 3 anos

Muitas são as manifestação do autismo, mas três aspectos são decisivos no diagnóstico: dificuldade de comunicação, capacidade limitada de socialização e interesses restritos aliados a comportamentos repetitivos. Os sintomas devem aparecer antes dos 3 anos de idade. Segundo Estevão, pacientes com o nível mais brando são bem articulados e sem alterações intelectuais. “A forma mais grave, normalmente, vem associada a algum retardo mental. O diagnóstico é clínico. Não tem aspecto biológico que mostre o autismo”.

A Síndrome de Asperger é uma versão branda do espectro autista. Sobre os portadores que apresentam sinais de genialidade — fenômeno conhecido como ‘Savanismo’ — o psiquiatra esclarece que o autista é ‘genial’ em apenas um assunto, como tocar instrumento ou decorar dados.

Em 60% dos casos, a origem do espectro é genética, e há uma lista de 300 genes que podem causar o transtorno. Outras causas do autismo são problemas na gestação, como infecções e uso de álcool, medicamentos e drogas pela mãe. O autismo não tem cura, e o tratamento é feito com profissionais como psicólogos, fonoaudiólogos e psicopedagogos. O uso de medicamentos é indicado.

POR DENTRO DA MENTE AUTISTA

Há oito anos, a autora americana Kathryn Erskine descobriu que a filha tinha autismo. Essa foi uma das motivações do romance ‘Passarinha’, que será lançado na Bienal do Livro. A obra conta a história de uma menina de dez anos autista e sua relação com o mundo externo após a morte do irmão.

1. Por que você escolheu o autismo como tema?

— Minha filha foi diagnosticada com Asperger quando tinha oito anos. Eu vi de perto as dificuldades de lidar com ela e os problemas de interação. Não foi fácil, mas percebi que eu tinha uma percepção dos dois lados do autismo. Eu quis dividir essa experiência e ajudar outras pessoas a superar obstáculos. O propósito do livro é ajudar pessoas a entenderem melhor os autistas.

2. Como está sua filha?

— Ela tem 16 anos e se desenvolveu muito bem.

3. O livro é ficção, mas poderia ser um caso real. Como você se preparou para escrevê-lo?

— Pesquisei sobre o tema por anos, li livros, artigos online e conversei com pais cujos filhos têm autismo. Também observei crianças autistas, participei de workshops e e conversei com profissionais. Como mãe e escritora também foi importante aprender o máximo possível. Quanto mais pesquisa, mais autêntico fica o trabalho.

4. Por que você optou por ficção ao invés de uma história real?

— Quis escrever algo que até uma criança pudesse compreender. Quis conduzir o leitor a ver o interior de uma mente autista e perceber que não é algo estranho. Muitas crianças me dizem que estão mais compreensivas com portadores de autismo depois do livro. Eu acho que uma ficção, desde que com embasamento teórico, funciona melhor do que um artigo científico para sensibilizar as pessoas.

5. O que você aprendeu escrevendo sobre autismo?

— Me ajudou a ver que o autismo é difícil e desafiador, mas tem bons aspectos. Além disso, o transtorno nos ajuda a sermos seres humanos melhores. Passei a ser mais paciente.

Você pode gostar