Por juliana.stefanelli

São Paulo - O paradoxo de que quanto mais se come, mais fome se sente acaba de ganhar uma explicação científica e que pode ser repetida por qualquer um que tenha dificuldade em manter o regime. Isto porque o pesquisador brasileiro Ivan de Araújo conseguiu provar que uma dieta rica em gordura enfraquece o sistema de recompensa do cérebro, aniquilando quase que de vez a sensação de saciedade mesmo quando a barriga está cheia.

O resultado desta “falha” no sistema de comunicação entre estômago e cérebro é a alimentação compulsiva. “No estudo, descobrimos que camundongos obesos se tornam menos sensíveis a ingestão de caloria e que esta deficiência está ligada a fisiologia do trato gastrointestinal”, disse ao iG Ivan de Araújo, pesquisador do departamento de Psiquiatria da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, e autor do estudo publicado nesta quinta-feira (15) no periódico científico Science .

Alimentação compulsiva prejudica sistema de comunicação entre cérebro e estômagoiG

A equipe de Araújo notou que animais com dieta rica em gordura apresentavam baixo índice de um lipídio chamado OEA no aparelho digestivo. Este lipídio tem a função de levar para o cérebro a mensagem de saciedade quando há quantidade suficiente de alimento no estômago. Como resultado da baixa de OEA no estômago, os animais estudados não liberaram dopamina, neurotransmissor associado ao sistema de recompensa no cérebro.

De acordo com Araújo, ainda é preciso fazer testes clínicos, mas a baixa nos lipídeos OEA pode explicar a dificuldade de muitas pessoas em manter uma dieta de baixa caloria por um longo tempo. A descoberta também pode levar a criação de uma nova droga que ajude pessoas com alto consumo de alimentos gordurosos a manterem regimes.

Até agora, a pesquisa em camundongos se mostrou satisfatória. Após a suplementação de OEA, os animais passam a escolher alimentos com menos gordura quando era dada a opção. “Os camundongos aderiram a uma dieta rica em calorias porque não tinham a sensação de recompensa enviada pelo cérebro. Porém quando administramos OEA em animais obesos, era praticamente recuperado o sistema de resposta”, disse Araújo.

Araújo afirma que a “falha de comunicação” entre estômago e cérebro tenha surgido como uma vantagem adaptativa quando humanos e outros animais passavam por alternância entre períodos de alimentação farta e escassez.

É neurológico, não tem a ver com paladar
No estudo, os camundongos eram alimentados por dutos que levavam a comida diretamente para o estômago. Desta forma, os pesquisadores conseguiram eliminar no experimento questões relacionadas com o paladar por alimentos mais ricos em gordura e estudar apenas as respostas do sistema de recompensa. “Assim, a única forma de o animal se dar por satisfeito era entender que havia certa quantidade de caloria no trato gastrointestinal”, disse Araújo.

Isto porque o pesquisador não descarta que outros mecanismos fisiológicos, como por exemplo, o tamanho do estômago, sirvam para enviar sinais ao cérebro sobre a sensação de saciedade. “O lipídio e outros mecanismos trabalham no sentido do trato gastrointestinal para haver este alerta”, disse Araújo.

Agora a equipe de Araújo quer testar os efeitos da aplicação de OEA no trato digestivo de humanos obesos e também testar os níveis de OEA em pacientes humanos que passaram por cirurgia de redução de estomago. “Queremos saber se a compulsão por comida em humanos obesos pode ser revertida com a suplementação de OEA e se a mudança comportamental após a cirurgia de redução de estômago altera o índice do lipídio”, disse.

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