Rio - O sociólogo Gláucio Soares, pesquisador o Instituto de Estudos Sociais e Políticos, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro ( IESP-UERJ) é um estudioso que se deu a missão de combater mortes violentas. Ele já trabalhou no Paz no Trânsito, no Distrito Federal, escreveu um livro chamado “Não matarás”, sobre homicídio, e agora está trabalhando sobre o suicídio. Leia a entrevista abaixo sobre anorexia , a mais letal das doenças mentais e veja a sua relação com o suicídio.
iG: Quais são as causas da anorexia?
Gláucio Soares: Seria bom saber. Não se sabe quais são. Sabemos apenas algumas situações que aparecem com mais frequência entre as pessoas anoréxicas, como terem sofrido violências na infância, terem tido uma relação conturbada com a mãe ou terem sido vítimas de bullying em relação ao corpo. Mas, a verdade é que sabemos ainda muito pouco sobre isto ainda.
iG: A incidência da anorexia está aumentando?
Gláucio Soares: Não tenho dados sobre isso porque no Brasil as nossas estatísticas são catastróficas. Nós estamos num patamar de evolução em estatística que é de muitas décadas atrás. Nós estamos correndo atrás do prejuízo. Então, como não temos dados, não temos como saber se a incidência está aumentando ou se o reportar do fenômeno é que está crescendo.
iG: Como a família pode perceber que o caso se trata de anorexia e não uma questão mais simples, ligada apenas a vaidade?
Gláucio Soares: Por causa dos limites. A anorexia vai além do admissível e causa danos. Uma coisa é dizer “puxa, fulana perdeu 5 quilos. Não precisava”. Outra coisa é uma mulher adulta que pesa 30 quilos. Em geral a anorexia chega acompanhada de outros problemas como depressão. E o sintoma aparente da anorexia também não é só deixar de comer. Ela é mais do que isso e inlcui hábitos como a da pessoa se cortar, se machucar.
iG: Por que a anorexia é a doença mental que mais mata?
Gláucio Soares: Em grande parte porque as ações que a definem são ações que comprometem a saúde da pessoa. Ou seja, está embutido no conceito de anorexia um dano voluntário ao seu próprio corpo. É diferente da depressão, por exemplo, que causa danos ao corpo e a mente, não necessariamente voluntários. Ou seja, quem está num estado muito sério de depressão também dorme mal, se alimenta mal e isso não é bom para a saúde. Mas no caso da anorexia é voluntário e persiste. Uma das estratégias de tratamento é a terapia de família, que impede que a pessoa com anorexia seja jogada de volta numa família que não compreende o problema que ela tem, não compreende sequer que é uma doença muito perigosa, possivelmente letal.
iG: A morte ocorre em consequência da doença ou do suicídio?
Gláucio Soares: As duas coisas. Você encontra em anoréxicas uma disponibilidade para o suicídio. Algumas vezes há um arrependimento, mas com frequência este arrependimento é tardio. É o caso de uma amiga minha que planejou o suicídio, deixando de comer e beber. Porém a pessoa não consegue executar o que planejou, porque a fome e a sede são desesperadoras. Só que com 30 ou 40 quilos a pessoa não tem força nem para buscar água e acaba caindo. Os ossos já são muito quebradiços, elas têm osteopenia e osteoporose até por conta da pouca alimentação. Logo, quando se encontra este corpo, está cheio de hematomas, quebrado e com danos graves nos órgãos. Mesmo que a pessa resista e chegue ao hospital, o chance de sobreviver é muito pequena. Minha amiga não resistiu.