Rio - Preocupada com o trânsito saturado nas grandes cidades, a Frente Nacional de Prefeitos (FNP) enviou semana passada ao governo federal o pedido para o retorno da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) sobre a gasolina. A proposta é polêmica, porque causaria novo aumento no preço do combustível, reajustado em 3% pela Petrobras no início do mês. A ideia é que o tributo, que já chegou a custar R$ 0,50 por litro, seja destinado aos municípios para viabilizar o barateamento das tarifas dos ônibus, em uma tentativa de também diminuir a quantidade de automóveis nas ruas.
“Quanto mais recursos forem destinados para o sistema de transporte público, mais barata ficará a tarifa, podendo, no limite, até zerá-la”, diz o presidente da FNP e prefeito de Porto Alegre, José Fortunati.
A Cide figura no centro dos debates sobre mobilidade urbana desde que foi reduzida a zero pela presidente Dilma Rousseff, em 2012, em meio à política de estímulo à venda de automóveis. Estudo realizado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) indicou que, se a Cide voltasse a R$ 0,25 por litro e fosse usada para financiar o transporte público, aliviaria as passagens de ônibus em 23% na média das regiões metropolitanas do país.
Frente a esse cenário, além de apoiar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de municipalização do tributo, o setor sugere que as gratuidades que impactam as tarifas em 18%, na média nacional, sejam custeadas a partir de recursos orçamentários e não pelos passageiros pagantes, como é hoje. “Historicamente, o setor dos ônibus no país parte do princípio de que a tarifa tem de cobrir a totalidade dos custos. Essa experiência se tornou um empecilho para avançarmos em qualidade”, aponta o diretor da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Marcos Bicalho.
Injustiça na política de combustíveis
Enquanto o aumento da gasolina, anunciado pela Petrobras na semana passada, foi de 3%, o diesel subiu 5%. O impacto no próximo reajuste da tarifa de ônibus deve chegar a até 3%, segundo estimativa da NTU. No Rio, onde o reajuste ocorre em janeiro, essa alta equivale a R$ 0,09.
“Nos últimos dez anos, o diesel, que pesa mais de 30% nas tarifas de ônibus, aumentou quatro vezes mais que a gasolina. A gente defende que o diesel também seja subsidiado. Ele poderia custar 25% menos do que é hoje se o aumento tivesse sido igual ao da gasolina”, afirmou o diretor do Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte (MDT), Nazareno Stanislau Affonso. Para ele, a política de transporte do país é injusta socialmente, porque beneficia quem tem carro e pune o usuário do transporte público, que é o mais pobre.
Passivo de R$ 400 bilhões nos investimentos
A ausência de investimentos robustos por décadas em empreendimentos de mobilidade urbana gerou um passivo de R$ 400 bilhões. A estimativa foi apresentada no congresso internacional Etransport, realizado este mês no Riocentro, pelo diretor da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Marcos Bicalho, que diz que essa é a quantia que terá de ser investida nos próximos dez anos para recuperar todo o tempo perdido.
“O país começou a engatinhar na subvenção aos transportes públicos nos últimos cinco anos, com os PACs de Mobilidade Urbana, mas ainda falta muita coisa a fazer”, apontou.
Frente de prefeitos cobra também aprovação do regime de incentivos
Na carta de reivindicações entregue ao vice-presidente da República, Michel Temer, na última segunda-feira, a Frente Nacional de Prefeitos defende também a instituição do Regime Especial de Incentivos para o Transporte Urbano de Passageiros (Reitup). O Reitup prevê a redução de alíquotas de tributos federais, estaduais e municipais incidentes sobre insumos utilizados na prestação de serviços de transporte coletivo, com o objetivo de promover a redução das tarifas.
A medida, que já foi aprovada no Senado e aguarda apreciação da Câmara, estaria parada porque o governo ainda não sinalizou se é favorável. “Para o Reitup avançar, temos que cobrar uma iniciativa do Executivo. É o governo federal que está segurando isso e ninguém vai pôr em votação algo que a presidenta pode vetar”, aponta o diretor do Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte, Nazareno Stanislau Affonso.
Segundo ele, o regime vai gerar uma reestruturação no transporte público, já que, para as empresas terem direito aos descontos, deverão cumprir exigências como a instalação do bilhete único, criação do conselho de usuários, obrigatoriedade de licitação do sistema de ônibus e transparência dos custos.