Rio - Restam nas cidades brasileiras poucas casas erguidas antes de 1930. A especulação imobiliária, associada à nossa insensibilidade à preservação da memória histórica, derrubou-as quase todas.
A explosão urbana e sua violência desfiguraram o casario. Agora, com seus muros altos e grades intransponíveis, as casas escondem a ‘cara’. Muitas adotam perfil penitenciário: cercas eletrificadas, câmeras de vigilância, portões acionados por controle remoto, etc.
Os prédios verticalizaram os moradores e, na medida do possível, abriram espaços para evitar ao máximo transitar neste lugar ‘perigoso’ chamado rua. Assim, surgiram edifícios dotados de piscina, academia de ginástica, playground, churrasqueira, salão de festa, etc.
O supermercado engoliu quase tudo isso ao concentrar em um único espaço tudo que se necessita para o lar, de alimentação a produtos de limpeza. Não combinava, porém, o supermercado dispor de prateleiras de joias, sapatos e roupas. Criou-se, então, o shopping center, onde se embute todo tipo de comércio.
Agora surge um novo conceito: o Atoll, um supershopping (71 mil metros quadrados) erguido próximo à cidade francesa de Angers. Além de 60 lojas e 12 restaurantes, abriga academias de ginástica, salão de beleza, playground, parques com fontes, árvores e alamedas ajardinadas. Enquanto os pais fazem compras, as crianças brincam em grandes módulos ou assistem a DVDs sob cuidados de funcionários especializados. A filosofia de marketing do Atoll é simples: saia de sua casa e ingresse no Jardim do Éden do consumismo.
Não ficarei surpreso se os shoppings do futuro oferecerem serviço de hotelaria, permitindo que o consumidor se livre do convívio familiar.
Frei Betto é escritor, autor de ‘O que a vida me ensinou’ (Saraiva)