Por bferreira

Rio - Uma das ciladas da vida é que casamento é para sempre, custe o que custar. E quantos casais conhecemos que estão presos nesta jaula do desamor, em nome dos filhos, dos bens, da dependência doentia de ter que sofrer, etc e tal? Esta semana ouvi que “aos trancos e barrancos já estamos casados há 25 anos...”. Sei, mas quanto de trancos e barrancos? Quase sempre? Todo dia, toda hora? Aí não dá, né? Porque o mais importante da relação é o polimento, é tratar o outro com cuidado, ter a intenção de preservar o parceiro da descortesia.

Óbvio que ela existe, são os rompantes aqui e ali normais na vida do casal. Se a patada for constante, viver num coice eterno deve ser a mais miserável das existências. É o que acontece com o casal de ‘Quem tem medo de Virginia Wolf?’, um dos mais importantes textos do teatro moderno, autoria de Edward Albee, agora montado no Teatro dos 4 pela extraordinária Zezé Polessa, sob direção de Vitor Garcia Peralta. São duas horas e meia de riso e dor, vindos de uma plateia que olha um casal se destruindo em ofensas barra-pesada e adultério consentido, tudo regado a uma bebedeira colossal, onde pedras de gelo são “gotas das lágrimas vertidas”. É água morro abaixo o turbilhão de horror que os dois são capazes de provocar, porque aquilo que eles chamam de vida, casamento, parceria é uma mentira braba da qual parecem não querer, ou não poder, sair.

Muitos dirão: é isto que é o amor, muito parecido com o ódio, você não sai! A personagem Marta foi perdendo a admiração ou a esperança depositada em Jorge, seu marido. O sonho que ela sonhou para os dois não se tornou realidade. E eles vão empurrando com a barriga, tudo salpicado por agressões exemplares. Bastaria dizer: se você pensa isto de mim, melhor eu me mandar. Mas aí não teria dramaturgia, e a gente vai ficando, para olhar no que aquilo vai dar. Se a personagem de Polessa é vil, piranhuda, armadora de situações, cheia de si, egoísta, o personagem vivido pelo competente Daniel Dantas é acomodado, sorrateiro, mas no limite da paciência, capaz de responder com igual crueldade ao jogo dificílimo proposto pela megera em cio.

Some-se a esta cena um casal jovem, que vai visitá-los (os atores Erom Cordeiro e Ana Kutner): dois patinhos na lagoa, prontos para serem abatidos pela voracidade dos mais velhos.
Uma noite de dramas, de gosto amargo na boca, muito bem encenada, com lindo cenário de Gringo Cardia e chique figurino de Marcelo Pies. Quem vai ao teatro para pensar? Quem aguenta uma encenação sobre o desamor, magistralmente jogado na cara de todo mundo? O teatro é sonho, resta ao publico prestigiar...

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