Por bferreira

Rio - O que pode embriagar mais que boas doses da sua bebida alcoólica favorita? O amor. O amor à vida é urgente, comprime a garganta, adoça e dá sensação de que você precisa segurar, conter, abraçar para sempre e pegar para si. Dá tonteira e extremos de sentimentos, empolgação e frustração. Quase uma bipolaridade. Nó na garganta se alterna com sensação de paz ao respirar. Amargor ao constatar as intempéries que surgem, o sal que não é o que tira o insosso, mas o sal necessário para dar equilíbrio ao doce. Ou a pitada de açúcar para tirar a acidez. Equilíbrios da vida.

Ao dar a papinha salgada para o neném, que a rejeitava, a tia disse: “É, bebê, vai se acostumando, porque a vida não é só mamão com açúcar”. O pequeno olhou para ela e abriu a boca, para depois engolir o purê a contragosto. E eu, que nunca tinha parado para pensar na expressão ‘mamão com açúcar’... Cada fase nova, um aprendizado, uma amostra do que vem pela frente para quem de verdade vive, observa, absorve.

O que pode ser mais tortuoso do que os caminhos errados que desembocam nos certos, sem que saibamos aonde nos levarão? Por que sofremos com certas decisões e acontecimentos e os antecipamos aos fatos? Vá aos poucos, botando cada vez mais sal, misturando tudo, para engolir.
“Se acostuma com isso, filho, nem está tão ruim assim. Sal é bom. Sem exageros. Aposto que você vai gostar de churrasco”, digo, enfiando mais uma colher de cenoura amassada com chuchu na boca da criança. “Poxa, isso é ruim à beça, ele tem razão”, eu penso. Mas como temos que disfarçar o que nos desagrada para aprender a viver!

Conformar-se com a solidão que surge mesmo quando não estamos sós. A solidão das nossas insatisfações recolhidas à sombra da ignorância dos outros. Um bem-estar de ressaca passando, mas que aos mais desatentos é apenas um bem-estar. Como se estivesse tudo bem. Um dia após o outro e, como nos Alcoólicos Anônimos, um dia de cada vez. Assim se leva a vida, achando a solução para cada equação, ou para o obstáculo do dia, e enxergando além, sob o foco que só o amor pode possibilitar, ou só quem gosta de amar se possibilita. O da certeza de que no final tudo se ajeita.

É como se vivêssemos bêbados, anestesiados, extasiados com a beleza da vida, deixando pra lá tudo que agride, camufla, salga em excesso. É só crer e deixar rolar, como se tudo tivesse gosto de frutinha amassada ou fruta do pé. Bem doce e furtivo. Pois com amor, tudo se fortalece. É mamãozinho.

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