Por adriano.araujo

RIo - Eis a síndrome da gata borralheira: o político, em mãos da fada marqueteira, ganha o perfil de linda donzela e ainda acredita que atrairá eleitores quais príncipes enamorados. Nesse baile de nobres, seu discurso adquire moderação, os temas polêmicos ficam debaixo do tapete, já não se pode distinguir entre a gata borralheira e as moças da corte.

Há na propaganda política uma abissal diferença entre o Brasil real e o Brasil eleitoral. Nos programas partidários exibidos na TV, as cenas externas, sempre produzidas do ponto de vista do candidato ‘diretor’, têm um único objetivo: impressionar os eleitores. Não seria caso típico de propaganda enganosa?

Os grandes partidos e coligações pagam milhões para a montagem dos programas para a propaganda de TV e rádio que, por sinal, nada tem de gratuita. Na verdade, as emissoras de rádio e TV não perdem um tostão por ceder seus espaços aos políticos, porque ganham isenção tributária correspondente ao que ganhariam com publicidade naquele horário.

O eleitor recebe, pela janelinha eletrônica, um produto tão maquiado quanto um refrigerante ou uma margarina. O candidato não fala o que pensa nem o que sente. Lê no teleprompter um texto elaborado pelos seus marqueteiros. Tudo soa falso: o sorriso, o tom de voz, o gesto e, quase sempre, as promessas.

Um modo de quebrar esse reino de cinderelas seria introduzir nas campanhas debates televisivos obrigatórios. Assim, a campanha seria pra valer, sem maquiagem, sem teleprompter, sem gestos ensaiados. O candidato diria o que pensa e o que não pensa, reagindo com suas emoções e convicções.

A propaganda eleitoral pela TV pesa muito nas oscilações da bolsa eleitoral de um candidato. Ocorre que o meio é a mensagem e, a TV, um veículo viciado. Nela o conteúdo importa menos que a emoção.

Em se tratando de campanha, tudo se complica, porque sobe nas pesquisas quem produz mais efeitos especiais. O bonito ganha do feio, o rico, do pobre, o histriônico, do tímido, o mentor de assassinos, daquele que defende os direitos humanos.

Em suma, essa engrenagem eleitoral é para manter o sistema e, com ele, as oligarquias no poder.
Por isso a reforma política é tão urgente quanto a agrária, em especial nos itens fidelidade partidária e controle dos fundos que sustentam as campanhas. Por enquanto, resta ao eleitor ficar atento para separar o joio do trigo.

Frei Betto é autor de ‘Reinventar a vida’ (Vozes)

Você pode gostar