Por thiago.antunes

Rio - Diante de um novo caso de agressão de jornalistas por parte de manifestantes, não custa discutir o uso do verbo criminalizar, tão citado nesses últimos meses. Responsáveis por atos públicos o conjugam apenas nas segunda e terceira pessoas — tu criminalizas, ele criminaliza/ tu criminalizaste, ele criminalizou. Assim, atribuem a outros (polícias, Ministério Público, Poder Judiciário, imprensa) a culpa pela criminalização de seus protestos. Dizem que não têm nada a ver com isso.

Admito que o uso dessas conjugações é razoável para definir determinados episódios, nem sempre as instituições acima citadas agiram de maneira correta. A polícia, por exemplo, muitas vezes agrediu manifestantes e repórteres; os responsáveis por tais gestos precisam ser identificados, processados e punidos. Mas, por justiça, responsabilidade histórica e fidelidade aos fatos, seria interessante que os mesmos ativistas, numa sincera autocrítica, avaliassem também conjugar o verbo na primeira pessoa — eu criminalizo, nós criminalizamos/ eu criminalizei, nós criminalizamos.

Quem agrediu jornalistas, depredou e arremessou rojões ou coquetéis molotov cometeu crimes e, portanto, colaborou para a criminalização de algumas manifestações, como fica evidente em muitas imagens — protesto não é crime quando feito de maneira pacífica. Não vale repetir o mantra que atribui os atos criminosos a supostos agentes infiltrados: seria absurdo admitir que os próprios manifestantes não tivessem desmascarado alguns dos tais P2 no momento em que eles praticavam alguma ação criminosa.

Participantes de atos públicos e alguns dos chamados midiativistas foram muito hábeis em localizar e, depois, agredir ou ofender, repórteres que, por conta da hostilidade de manifestantes, se viam obrigados a trabalhar em protestos sem crachás de suas empresas

A história ensina que a violência pode fazer parte da luta política e é, muitas vezes, legítima. Durante as manifestações iniciadas em 2013, ativistas depredaram e agrediram; outros defenderam quem praticava tais atos. Os gestos eram considerados parte de um processo revolucionário, de contestação à ditadura que viam implantada no país.

Eles podem achar o que quiserem, mas é covardia negar o que foi feito, não podem se esconder numa fraude que se evidencia na conjugação capenga de um verbo. Além de atos enquadráveis no Código Penal, eles cometeram um outro crime grave, de natureza política, o de colaborar para esvaziar protestos que exigiam um país melhor e mais justo.

E-mail: fernando.molica@odia.com.br

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