Por bferreira

Rio - Quase duzentos anos após a Imperatriz Leopoldina ser a primeira mulher a exercer o poder político no Brasil, novamente uma mulher está nos governando. Esse é um registro muito importante para o poder feminino, mas é bom que se diga que foi a Marquesa de Santos quem inaugurou a prática de corrupção em nosso país. Por suas mãos e pernas passavam a escolha de ministros, desembargadores, negócios e concessionários do Império, tudo mediante a histórica e culturalmente consagrada “comissão de intermediário”. A nossa madame “Pompadour” não tinha limites, intermediava liberação de cargas retidas no porto, nomeava servidores e enriquecia sem qualquer controle ou qualquer tipo de fiscalização.

Pela intermediação de Domitila de Castro, segundo os historiadores, o imperador utilizava-se de meios de transportes, ontem barcos, hoje helicópteros e aviões, sob o olhar compassivo dos agentes de fiscalização. Esse costume monárquico não foi abolido com a proclamação da república e nós assistimos a sua reiteração nas práticas públicas. D. Pedro, a pedido de sua amante, mandou sumir processos que investigavam mortes e atos de corrupção e o poder moderador e fiscalizador então dominado pelo monarca era o que prevalecia.

A lamentável morte de um postulante à Presidência da República deu-se numa aeronave cedida por empresários, um helicóptero particular caiu no governo estadual passado ceifando várias vidas. O veículo oficial do governo servia para transportar convidados particulares, familiares e até o cão de estimação e nada ficou apurado. Essa chaga que acompanha a República precisa ser combatida com veemência, mas quem o fará? A quem cabe fazer? Ninguém desconhece a influência política de uma primeira-dama na escolha de determinados cargos públicos de eleição do governo, e é comum nessas ocasiões o beija-mão da “imperatriz”.

A ação de Leopoldina foi de muita importância para a conquista da independência do Brasil, através de sua cultura refinada, sua formação nobre e religiosa. Mostra o quanto deixou de herança positiva sua disposição para servir as boas causas, para proteger e ajudar os mais pobres e oprimidos. Quantas vezes interferiu para que escravos não fossem açoitados, para corrigir injustiças, enquanto a mante oficial do imperador conspirava contra os bons costumes, vendia a coisa pública como se privada fosse e interferia nos negócios do estado como uma advogada que usava a máquina do Império em proveito pessoal.

Pena que essa semente tenha crescido tanto e não a plantada por Leopoldina, e hoje ainda assistimos, impunemente, aos crimes praticados contra o Tesouro Público à luz do dia como se essa fosse uma ação aceitável, enquanto toda máquina é movimentada para impedir que o povo se manifeste e o apartheid social continue mandando para o sistema penitenciário os pobres, negros e indesejáveis do sistema dominante.

A lei muitas vezes é usada como espada para cortar na carne todo aquele que ousa denunciar essa incúria com o bem público e a conivência de algumas instituições.

Siro Darlan é desembargador e Coordenador Rio da Associação Juízes para a Democracia

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