Por bferreira

Rio - Foi um reencontro com um amor antigo. Há muito tempo eu não subia a serra, não frequentava Itaipava, Nogueira e Araras. Fazia tempo que eu não experimentava a sensação e a delicadeza de uma cidade pequena. Pressionada pela correria do dia a dia eu acho mesmo que tinha me esquecido de como a vida mais calma é sedutora.

Como é bom voltar a um lugar de boas lembranças e menos tensão. Como a conversa flui mais leve, como é prazeroso jogar conversa fora, rever lugares e pessoas que não se via há tempos. É como amigo antigo. Você não encontra há muitos anos e quando revê parece que a conversa é retomada como se o tempo, entre um momento e outro, não tivesse passado, ou existido. Foram só três dias, mas a capacidade de repor energias, de se revitalizar, faz parecer que o tempo foi multiplicado.

Parece até que a falta de tempo da cidade grande incomoda muito mais em tempos de calma do que no fluxo corrido da rotina. É como se a calma do interior ampliasse a sua visão do mundo e deixasse nua, na sua frente, a maneira insensata como se vive nas grandes cidades. Tudo é diferente, mais lento e menos ácido quando se tem mais tempo para si mesmo, para reflexões e escutas.

Os amigos que reencontro optaram por viver outra rotina. Trocaram apartamentos em Ipanema e Copacabana por casas no campo. Deixaram de lado rotinas pesadas de trabalho por ocupações mais leves, horários mais flexíveis e atividades mais agradáveis. Continuam trabalhando, pagando suas contas em dia, reclamando de malfeitos e desgovernos e até engarrafando nos finais de semana, quando a população destas cidades se multiplica, mas, como diria o poeta Drummond, seus ombros já não suportam o mundo.

Coisas simples, como atravessar uma rua, surpreendem quem circula na serra. Os carros param para você passar e ninguém se pendura na buzina assim que o sinal de trânsito abre. Há mais sorrisos que fisionomias emburradas. É bem verdade que, às vezes, o sinal da internet é mais lento, o serviço de bares e restaurantes também, mas as histórias de vida são contadas num outro ritmo, as comparações entre o viver na serra e nas grandes cidades privilegiam a vida do interior, a escolhida por eles. Mas é inegável que dá uma vontade louca de abandonar a correria daqui, os engarrafamentos intermináveis e os medos cada vez mais presentes no dia a dia pela possibilidade de ter mais paz e pela promessa de mais felicidade.

Claro que não é tão simples como pode parecer. Claro que toda escolha implica em renúncia. Claro que cada um é cada um e reage de um jeito diferente. Mas uma coisa é certa: conhecer outras possibilidades de vida dá outro sabor à existência. E me faz lembrar de novo o poeta quando ele diz: “Teus ombros suportam o mundo e ele não pesa mais que a mão de uma criança”. Ele tem razão. A vida é uma ordem. Com ou sem mistificação.

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