Por bferreira

Rio - Subo as escadas que dão acesso à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, a Alerj, para participar da solenidade em homenagem aos 106 anos da Umbanda, religião nascida no Brasil. Recebo uma moção das mãos do Deputado Átila Nunes, um nome que se confunde a esta doutrina espritual, fé e resistência, as mesmas palavras do samba.

Noite de pura energia, o coração bambeou quando chamado ao plenário para receber a comenda. Percebi um vídeo preparado para a cerimônia, imagens de artistas expressando suas crenças em músicas consagradas da nossa história, a maravilhosa Clara Nunes, os mestre Zeca Pagodinho e Martinho da Vila. No momento final, a canção feita com o meu parceiro Aldir Blanc pra São Jorge, meu santo guerreiro. Lembrei da oração, cercada com a sua divina graça, ‘andarei vestido e armado para que os meus inimigos tendo pés não me alcancem e nem em pensamentos eles possam me fazer mal’.

O ogan Tião Casemiro canta pontos de louvor à paz, voz de barítono na liturgia do salão, atabaques em diferentes afinações, e o plenário se transforma na cabana dos pretos velhos, a origem de tudo. A timidez me emudeceu, mas agradeço por esse momento, áurea definitiva na minha vida.

Em 2003, compus com o mestre Paulo Cesar Pinheiro um samba chamado ‘Som de Prata’, todo inspirado na vida e obra do gênio Pixinguinha. Nos versos, a lembrança de sua morte numa igreja, quase um atestado de santidade, um título de orixá, um preto velho da raça África­Brasil.

Vem à memória a primeira estrofe, citando que o autor de ‘Carinhoso’ nasceu do dia 23 de abril, Dia de São Jorge, data marcada no meu calendário por toda existência, feito uma tatuagem, definitiva.

Há poucos dias cantei esse samba. Aconteceu quando estive em Belo Horizonte num espaço lindo chamado Quintal do Divina Luz, um ‘quilombo’ nos arredores da cidade. Lotado de boas energias, assim como os caboclos na pajelança, percebi um cavalo branco pintado no fundo do palco, o dragão embrenhado na maldade, acuado diante da lança do soldado e sem forças diante da nossa fé.

A música cantada por todos foi a extensão da nossa fé. Ando emotivo com essas expressões imateriais. São bens sem impostos, varandas de bons deslumbramentos com vista pra esperança e muitas vagas no coração. Na porta de entrada, sem chave, sem segredos, um aviso: 

‘Bem vindo à esperança!’

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