Por bferreira
Rio - Até o ano passado, eu pensava que circular de táxi pelas ruas do Rio só era ruim no mês de dezembro, sob o manto do 13º salário, com o aumento do número de passageiros. Claro que eu também achava que eles só desapareciam completamente das ruas em dias de chuva, momentos em que quase todos os cariocas esquecem a gentileza e o bom humor.
Mas neste quase dezembro descubro que a situação ficou ainda mais complexa do que no último ano. E ainda nem começou a chover. Agora eles fogem também dos horários de mais trânsito, por conta dos engarrafamentos. Se, por um lado, os aplicativos melhoraram muito a vida dos usuários e a dos motoristas também, por outro as características de cada taxista ficaram mais evidentes e o comportamento, menos sociável. Você entra no táxi e os adesivos intimidam qualquer um. Espalhados no veículo eles são taxativos.
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Não fume. Não coma. Não beba. Não bata a porta. Não acenda a luz. Ou você entra no táxi e tem que gritar para o motorista seu trajeto porque o rádio está tão alto, mas tão alto, que, se a corrida for longa, é melhor descer do veículo. Claro que você pode pedir para baixar o volume. Ele vai fingir que aceita, vai simular o movimento, mas o som vai continuar alto. E nunca é um noticiário, é sempre um programa daqueles que o locutor conta uma tragédia, aos gritos. E ainda tem aqueles muitos que têm televisão a bordo, sempre ligada num programa policialesco, com direito a imagens de mortos e feridos. E esses sons se misturam às dezenas de sons dos aplicativos que apitam, chamam “Táxi! Táxi!”, tocam campainhas e se misturam aos toques dos celulares particulares deles, que também tocam várias vezes e você vai, circuito afora, ouvindo e participando da vida dele, sabendo que a mulher foi ao médico, o filho está com saudade, o colega taxista foi ao Detran, mas não conseguiu resolver suas questões.
Dai-me paciência. Sim, porque é preciso muita paciência para conviver com todos esses ruídos, nesses engarrafamentos intermináveis. E, claro, o motorista vai ficando com menos humor a cada quilômetro. Claro que não são todos. Tem os competentes, cordiais, profissionais, os simpáticos, que contam histórias, que se orgulham de trabalhar há mais de 46 anos na praça, que sabem o melhor trajeto, ou aceitam com boa vontade sua sugestão e tornam a viagem menos desagradável. Tem também o que gosta de contar o último assalto que sofreu ... Noite dessas, ouvi de um deles o comovente relato sobre a morte do filho, no Metrô, por conta de um fio desencapado e sua interminável luta por Justiça. “Vida que segue”, ele diz, terminando o relato. Desci rápido do táxi, para que ele não visse minhas lágrimas.
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