Por bferreira
Rio - À beira de um ataque de nervos, escuto o décimo grito no aplicativo do motorista:
— Táxiiiiiiii! Táxiiii!
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Dentro do carro, uma sensação de pinball marcando pontos extras; uivos prevenindo os pardais e suas multas, e uma voz feminina saindo da rádio perguntando sobre a área 2, TKS. Solto o cinto com cara de poucos amigos. O condutor balança os ombros, sem se desculpar. Ainda escuto um grunhido de troco:
— É a modernidade, doutor...
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No calendário de novembro, duas festas em destaque, roupa nova e, claro, depesas. Um casamento com lista de presentes, um site específico, senha e inúmeras possibilidades pro seu bolso. O noivo, bom sujeito, merece. Clico na página e encontro: uma tarde agradável observando a vista da reserva da Tanzânia.
Ainda atentei pro cortador eletrônico de cebolas, mas decidi pela África, uma bela lua de mel.
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Há pouco, reencontrei o casado, já com os pés na rotina, não segurei:
— E as zebras, as gazelas da Tanzânia, interessantes?
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— Cumpadre, tu ‘tá’ falando de quê? Das núpcias?
— Sim! Entrei no racha...
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— Ah, a lista. Os presentes são apenas ilustrações. Nem saí de casa. Esquece rifa, vaquinha, estou falando de modernidade, amigão.
No outro evento, aniversário da família do cunhado, o regabofe acontece num salão apropriado.
Conheço bem o homenageado, escolho um tinto de raras cepas, tiragem limitada, abro um riso João Nogueira, mas sou barrado pelo segurança engravatado: “O presente fica. Será entregue depois, depois”.
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O prazer de ver o felizardo rasgar o papel do presente, desembalar da caixa e salivar diante o rubi dos taninos, eu perdi. Ainda perguntei à patroa: “Pode isso?”, mas ela argumentou que agora é assim, moderno.
Depois soube, na fofoca do balcão da esquina, que fulano perdeu a mulher pra vizinha do terceiro andar. Já sei...
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