Por thiago.antunes
Rio - O Instituto Atá lançou o projeto ‘Gastronomia é cultura’. Claro que gastronomia é cultura. Comer é um ato natural e biológico. Mas, o que comer e como comer é que faz o diferencial e é resultado do mundo da cultura. O hábito alimentar do brasileiro pouco tem dos povos originários. Poucos elementos nativos foram incorporados à nossa dieta. Colonizadores trouxeram seus alimentos e seus hábitos. Com exceção da mandioca é raro o ingrediente na mesa do brasileiro que não tenha origem exterior.
A batata, o milho e a banana são americanas. Manga, jaca, laranja, uva são de origem ainda mais remota. Boi, porco e galinha também não são nossos. A construção da brasilidade na culinária não se fez com os ingredientes, mas na forma de seus preparos. O milho é mexicano, mas a broa de milho é mineira. Mesmo tendo ingredientes da África o acarajé, o vatapá e o caruru são baianos.
Publicidade
Também já se desprezaram os hábitos alimentares dos brasileiros. O livro ‘Feijão, angu e couve: ensaio sobre a comida dos mineiros’, de Eduardo Frieiro, é um descalabro. Contém elogios ao bife com batata frita, considerado ‘modo superior de alimentação’ a que Monteiro Lobato diria ser pensamento de homem colonizado.
Joaquim Barbosa, agora midiático, quando presidente do STF, disse que seu antecessor era um reles brasileiro, caipira que não conhecia o conjunto musical The Ink Spots. Na mente do colonizado conhecer um conjunto musical estrangeiro o torna especial. É este tipo de elite que se está recriando no Brasil, sem compromisso com os valores do povo brasileiro.
Publicidade
Com a redemocratização do Brasil em 1985 foi editada lei de incentivo à cultura e o ministro Aluísio Pimenta surpreendeu com um programa apoiado em manifestações da cultura regional, apelidado pelo ‘moderno’ jornal ‘Folha de S. Paulo’ de ‘a cultura da broa de milho’. O mesmo jornal não chamou de ‘cultura da peruagem’ os gastos da ministra da Cultura Marta Suplicy para desfile de moda em Londres, o que foi feito por Ricardo Boechat. Ao contrário, lhe abriu espaço para dizer que o desfile de moda financiado com dinheiro público servia para mostrar imagem positiva do Brasil.
Quem faz a cultura popular é o povo. Recursos públicos para financiar o pedantismo de chefs e suas cozinhas é desperdício de dinheiro que é público e portanto de todos. A culinária, expressão da cultura do povo brasileiro, não demanda verbas para sua subsistência. A cultura da apropriação de verbas públicas é que é outro tipo de cultura.
Publicidade
João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política pela UFF e juiz de Direito
Publicidade