Por adriano.araujo, adriano.araujo
Rio - No meu tempo de Ensino Fundamental, a redação tinha o belo nome de ‘composição’. Ainda hoje, ao escrever, me sinto ‘compondo’, imprimo ao texto uma musicalidade que os entendidos chamam de ‘sotaque literário’.
As novas tecnologias ameaçam o prazeroso ato de ler e escrever. Fissurados nas redes sociais, muitos reduzem a linguagem aos seus signos elementares e preferem ver o turbilhão de imagens a ler a cadência narrativa.
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Ler e escrever exige educação, aprendizado, amor à palavra lida e escrita, para que ela nos ofereça seus múltiplos significados e nos revele a beleza que encerra.
A presidente Dilma, ao ser reempossada, a 1º de janeiro último, cunhou o lema: “Brasil, pátria educadora.” Prometeu que a Educação, afinal, será prioridade de governo (embora já tenha sofrido um corte, este ano, de R$ 7 bilhões em seu orçamento).
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Tomara que o governo ponha fim às escolas sucateadas, à má remuneração dos professores, à carência de tempo integral. As escolas públicas, excetuando universidades, fingem que ensinam, e os alunos fingem que aprendem. Qual será o futuro de uma pátria cujos cidadãos e cidadãs não sabem escrever uma simples redação escolar?
Há pouco saiu o resultado do Enem 2014. Prestaram os exames 5,9 milhões de jovens brasileiros. O estudante aprovado no Enem tem o direito de se inscrever para ocupar uma das 205.514 vagas oferecidas, em 2015, por 59 universidades federais; 38 institutos federais de Educação, Ciência e Tecnologia; e dois centros federais de Educação Tecnológica.
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Dos quase seis milhões inscritos, 529.374 ganharam nota zero em Redação, cujo tema proposto foi ‘Publicidade infantil’, questão em debate na sociedade, suscitada pelo Instituto Alana. Entregaram a prova em branco 280.903 alunos. São os analfabetos funcionais, aqueles que não cultivam o hábito de leitura. Sabem ler, mas não compreendem o que leem. Redigiram um texto alheio ao tema 217,3 mil. Treze mil copiaram o texto motivador; 7,8 mil escreveram menos de sete linhas; 3,3 mil embutiram na redação trechos do texto motivador de forma desconectada; e 955 escreveram ofensas aos direitos humanos. E apenas 250 mereceram a nota mais alta!
Os que mereceram nota máxima em redação revelaram a razão do êxito: o hábito de leitura de livros e redação de textos. Hábito que começa na infância, quando pais e professores contam e leem histórias, ajudando a criança a desenvolver a síntese cognitiva.
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Frei Betto é autor de ‘Alfabetto – Autobiografia Escolar’ (Ática)