Por bferreira

Rio - As manifestações contra o governo federal do dia 15 entraram para a história não apenas por mostrar a capacidade de mobilização das redes sociais para a ação política de protesto, fato que as jornadas de junho de 2013 já haviam atestado. O ato na Avenida Paulista se destaca pelo alto número de pessoas que aderiram — embora varie bastante conforme a fonte. A PM de São Paulo e as lideranças falaram em 1 milhão; o Datafolha calculou 210 mil. Na manifestação em defesa da Petrobras e do governo, dia 13, na mesma avenida, a divergência já havia ocorrido, mas ao contrário: 12 mil para a PM, 41 mil pelo Datafolha. Como explicar? Incompetência ou viés político? De quem?

Porém, o que me traz a esta coluna é uma preocupação que poucos parecem compartilhar: como anda a qualidade da nossa democracia? Democracia é pedir intervenção militar? Democracia é se negar a ouvir o que o governo tem a dizer batendo panela toda vez que um representante se pronuncia? Não, democracia é, sobretudo, abertura ao diálogo, mesmo que não se concorde com uma única palavra do que o outro está dizendo. Democracia é diferença e convivência respeitosa com a mesma. Ir à rua protestar é um direito democrático. Permitir que o outro se manifeste é um dever democrático. Democracia é feita de direitos e deveres, mas principalmente de crença em seus valores.

Aí chegamos à chaga, que parece nunca cicatrizar, em nossa cultura democrática: a sombra do autoritarismo. Observemos algumas frases em cartazes do dia 15: “SOS Forças Armadas”; “Intervenção Militar Já”; Brazilian Army. Please Help Us! We Need Military Intervention” (em inglês, por quê?); “Intervenção Constitucional Militar”. São muitos e repetidos os exemplos, porém, que não parecem ter causado indignação pública.

O Brasil é uma democracia imperfeita, diz a consultoria britânica Economist Intelligence Unit, ao classificá-lo em 44º lugar. Como dizer que pedir intervenção militar é um ato democrático? Pedir a deposição de um governo legitimado pelas urnas também não o é. Pedir o impeachment da presidenta, um processo previsto constitucionalmente, é mais democrático? Se existirem indícios de crime de responsabilidade na vigência do atual mandato, sim. Do contrário, não. Neste caso, o pedido de impeachment equivale ao de intervenção militar, pois visa ao mesmo objetivo: reverter o resultado das urnas. A maioria silenciosa que assistiu a milhares de pessoas irem às ruas tentar usurpar seu direito de voto também aguarda resposta do governo.

Marcia Ribeiro Dias é cientista política e professora na Unirio

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